Efeitos não Previstos

Comum em Políticas Públicas

Neste mês tivemos o dia internacional da mulher, e como forma de homenageá-las (e de também impulsionar suas receitas), a academia na qual eu treino criou uma promoção: "Durante todo o mês de março, quaisquer mulheres poderiam entrar na academia sem pagar". 

Pensei um pouco nos efeitos que essa medida poderia gerar. Talvez atrair novas pessoas. E com um pouco de otimismo, esse público, ou parte dele, gostaria da academia e se matricularia após a promoção? Neste caso, a promoção teria sido bem sucedida em atrair novos clientes e elevar as receitas.

Outro efeito poderia ser aumentar a publicidade da academia. Ainda que parte das beneficiárias da promoção não se matriculem após o fim da campanha, certamente elas falarão sobre a academia em círculos familiares e sociais. Assim, a promoção faria a academia mais conhecida. Como as instalações da academia são muito boas, provavelmente o feedback seria positivo. 

E os efeitos negativos? Tudo o mais constante, a liberação das catracas para as mulheres iria encher mais a academia. Alguns aparelhos teriam filas ou revezamento para serem utilizados. Portanto, como impacto negativo, essa promoção tornaria menos ociosa a capacidade da academia. Esse custo seria imposto principalmente sobre os seus clientes - algo não recomendado, impor custo sobre quem tem contribuído com a academia.

Leitor, esqueci de algum efeito? Concorda com esses efeitos?

Agora vem o efeito que eu não esperava. Algumas mulheres que treinam na academia e pagam o plano anual tem a opção de trancá-lo por até 2 meses no máximo - em caso de viagens ou afastamento (eu tenho esse plano também). Todavia, percebendo que durante todo o mês de março mulheres não pagariam, algumas trancaram os seus planos (outras ameaçaram fazê-lo). Desta forma, elas "ganhariam" um mês grátis ao passo que estariam prolongando os seus respectivos planos anuais. Muitas dessas pessoas não usam os 2 meses de trancamento possível. Mas a oportunidade surgiu. 

Esse efeito não esperado implicaria na perda de receitas da academia justamente com os seus clientes. 

Percebendo o efeito colateral, os donos restringiram a promoção para toda segunda feira no mês de março. Daí o incentivo de trancar planos anuais foi por terra abaixo. 

Algumas pessoas criticaram essas moças por terem procedido dessa forma. Ouvi frases do tipo: "o brasileiro tenta tirar vantagem de tudo". Ouvi críticas morais direcionadas a elas. Ouvi também que esse tipo de conduta era uma: "economia porca". 

Eu em meus 35 anos de vida e experiência acumulada, aprendi que normalmente não é bom moralizar a conduta dos outros. Certamente procedemos em uma parte de nossas vidas na qual nos portamos não da melhor forma possível; algumas vezes nem sabemos disso. Tomamos consciência com o tempo - talvez com o toque de amigos. De toda forma, se todos somos falhos - e humanos certamente são seres falhos -, por que criticar tanto?

Como economista, tenho que dizer que esse tipo de efeito não esperado é muito comum em políticas econômicas. Mira-se algo e obtêm-se outra coisa. Daí porque é muito difícil "acertar" na implementação e construção de políticas econômicas. Admito que, no caso da academia, não tinha pensado que o efeito que descrevi poderia ocorrer. Fui surpreendido. Como agentes econômicas, as mulheres que trancaram os seus planos miraram reduzir despesas financeiras. É um princípio da Ciência Econômica: todos agentes econômicos tomam medidas para melhorarem suas situações. Elas seguiram o livro didático dessa ciência.

Veja que a análise não incorpora moralismo. Apenas racionalismo econômico. Mas a vida vai além da economia. 

De toda forma, foi interessante notar esse "experimento".