Tendem a durar até quando o negacionismo econômico prevalecer
Como tem sido o caso nos últimos anos, o governo brasileiro se viu testado pelo mercado financeiro nas últimas semanas. O dólar atingiu desvalorização cambial elevada e abrupta. Parece que vai demorar para a taxa de câmbio voltar aos patamares de 3 ou 4 reais por dólar. Analogamente, acho difícil da taxa de juros Selic cair para valores muito baixos. A falta de ajuste das contas públicas – ou mesmo de uma indicação de que algum ajuste ocorrerá – complica as quedas tanto da taxa cambial quanto da taxa de juros.
Paralelo a esses eventos está a teimosia de Lula e de seu partido em admitir a responsabilidade pelo desequilíbrio macroeconômico. Interpreto como negacionismo científico a posição do Partido dos Trabalhadores (PT) e de outros partidos aliados. Estes acusam o mercado financeiro de ganância, de excessiva sensibilidade a falas (irresponsáveis e impróprias) do presidente Lula, e de desejarem o pior ao país para lucrarem com altas taxas de juros. Às vezes sobra até mesmo para o banco central, a instituição responsável por manter os preços em declínio. Argumentam que o banco central joga contra o povo brasileiro! Pois o que ocorre é justamente o contrário: sem o banco central independente e comprometido com a estabilização dos preços, estaríamos em uma situação ainda pior! Provavelmente com inflação de dois dígitos, taxa de câmbio superior a 6 reais/dólar e taxa de juros que financia a dívida publica em patamares elevados.
Tenho a recordação de que, corretamente, o PT acusou o ex-presidente Jair Bolsonaro de terraplanismo e de negacionismo científico durante a pandemia da Covid-19. Bolsonaro não deu a seriedade devida ao vírus, questionou a importância das vacinas e foi pródigo em frases infelizes. Mas eis que o PT adota comportamento similar na esfera econômica! Por isso, durante os anos do coronavírus, considerei uma hipocrisia um partido que é terraplanista na economia acusar outro de terraplanismo na biologia/virologia/medicina.
Voltando ao tópico inicial: Lula e o governo brasileiro estão reféns do mercado financeiro? De jeito algum. O que ocorre é que a economia brasileira caminha para a insolvência fiscal, com dívida pública em trajetória ascendente, e crescente pagamento de juros provenientes desta mesma dívida. O fato de não sabermos exatamente quando uma crise de confiança irá ocorrer (é sempre um evento dificílimo de prever) não significa que ela não irá ocorrer. A década de 1990 foi marcada por crises de confiança. As principais foram no México em 1994, na Rússia em 1997 e no Brasil em 1998. Em todas, a população pagou o pedágio com perda de renda e desemprego.
Não há muita saída para Lula. O ajuste fiscal é o caminho para estabilizar a economia do país. Claro, se o nosso país fosse poupador, significando que ele arrecadasse mais do que gastasse, sem dívida pública, Lula poderia ignorar e desprezar o mercado financeiro, pois o país não precisaria de credores para financiar o seu gasto. Mas vivemos em situação completamente oposta. O Brasil é dependente do mercado financeiro para financiar os seus gastos – isso ocorre pela emissão de títulos pelo Tesouro Direto. E note que o mercado financeiro engloba todo indivíduo que compra (investe) em título público (eu sou um deles). Desejamos o pior ao país? Claro que não.
Lula foi presidente de 2003 a 2010. Eu entrei no curso de Ciências Econômicas em 2009. Portanto, era um aluno de graduação durante os últimos anos de Lula, quando este entregou forte crescimento econômico. Todavia, estudando o período cheguei a conclusão de que Lula se beneficiou das reformas estruturais realizadas pelo seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso (FHC), e ainda contou com o boom das commodities, que jogou os preços dessa commodities para valores elevados, contribuindo ainda mais para o aumento do PIB brasileiro. Em resumo, Lula surfou na onda de um cenário internacional favorável e em uma economia prontinha para crescer.
Mas agora, quando assumiu a presidência, Lula teve de lidar com uma economia enferma, necessitando das pouco populares, chatas e incômodas reformas estruturais que FHC implementou durante 1995-2002. E o que Lula fez? Se omitiu. Joga a culpa em outros. E não temos crescimento forte do PIB. Bom, pelo menos esses últimos anos serviram para eliminar a ilusão de que Lula teria algum “truque” para entregar crescimento econômico com aumento da renda. Não tem. O truque continua sendo reformas estruturais, ajuste fiscal e equilíbrio macroeconômico, aquelas coisas chatas que o mercado financeiro exige de tempos em tempos.
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