sábado, 22 de março de 2025

Resenha: Pai Rico, Pai Pobre (Robert T. Kiyosaki)

Rumo à independência financeira!

dinheiro riqueza


Pai Rico, Pai Pobre é um best-seller, livro muito famoso entre o público que busca por educação e independência financeira. Talvez devido a sua linguagem acessível e prosa otimista, ou mesmo pelos conselhos (às vezes indo contra o senso comum) de investimento, a obra ainda influencia muitas pessoas. 

O ponto inicial é a dicotomia entre o pai pobre (que é o pai de fato do autor) e o pai rico (pai de seu amigo). O pai pobre é altamente escolarizado, com diplomas, mas toma decisões financeiras que comprometem o seu bem estar, enquanto o pai rico dita as recomendações financeiras, sendo rico e próspero. Daí já se vê que a obra critica a educação formal de faculdades. 

A primeira lição é que os ricos não trabalham para o dinheiro, mas é o dinheiro que trabalha para eles. As recomendações são conseguir formas de obter renda de investimentos (portfólio) e ter renda passiva, e sempre investi-la para que ela se torne um ativo, reforçando o ciclo financeiro. As classes de renda média e pobre focam em trabalhar para conseguir renda, tendo somente uma fonte de rendimento. E essas, tão logo obtém renda, tentam expandir o consumo, talvez se endividando - o que as fazem trabalhar ainda mais duro para elevar a renda. Robert (na verdade, é o seu pai rico) denota esse ciclo de "corrida do rato". 

Ainda que não formalmente discutido, isso é nada menos do que o consumismo da sociedade moderna, tema amplamente discutido por Zygmunt Bauman. O consumismo nos força a gastar a renda que obtemos em bens supérfluos, fazendo com que nunca nos sentimos saciados ou satisfeitos. É uma corrida sem linha de chegada. Quando nos aproximamos da linha (isto é, compramos o produto), ela se estica (outro produto, muito similar, mas levemente superior é criado), e assim continuamos a correr para acompanhar a moda, o que é novo, para confirmar e reforçar o status social. É isso que Robert denota quando levanta o termo "corrida de rato". Um exemplo dessa corrida sem fim é o lançamento anual de carros da mesma categoria.

A segunda lição mostra que o importante não é tanto o que ganhamos, mas o tanto que conseguimos manter. Os ricos constroem ativos, que geram renda e elevam o patrimônio. Os pobres adquirem dívidas e financiamento - comprometendo a renda futura. Talvez juros sobre essa dívida irão consumir suas receitas mais ainda. Por outro lado, ao adquirir ativos, os juros irão trabalhar para nós, elevando nossos rendimentos conforme tenhamos paciência para investir, reinvestir e não usar parte desse investimento. Daí temos a terceira lição, para focarmos nos nossos ativos. Direcione a sua vida para a construção de ativos: mantenha o emprego, mas busque formas alternativas de complementar a renda, preferencialmente trabalhando para você mesmo. Outro ponto do livro é o incentivo para se tornar empresário, empreendedor, e deixar de trabalhar para terceiros. 

A quarta lição é para termos uma corporação, ainda que ela não tenha funcionários! No Brasil, ser uma pessoa jurídica auxilia a pagar menos impostos - justamente o ponto defendido pelo autor. Ricos pagam menos impostos, pois utilizam de meios legais para driblar a tributação (ok, alguns usam meios ilegais também). 

A quinta lição é que o rico cria e inventa dinheiro. Para isso, todavia, temos de ser ousados, correr riscos, assumir cenários incertos. Fracassos fazem parte dessa trajetória. Na verdade, como explicado pelo autor, diversas celebridades e magnatas faliram e fracassaram quando mais novos, mas continuaram e avançaram (é o famoso "keep going") Investidores bem sucedidos perderam dinheiro ao longo de suas caminhadas - é inevitável. Parte do aprendizado ocorre somente pelo erro. Um empresário bilionário e amigo do autor, o atual presidente dos EUA, Donald Trump, caso não fosse bilionário, ele o teria sido em pelo menos dois momentos: i) quando criou sua própria rede social, e ii) quando criou uma criptomoeda. Não sou um grande fã de Trump, acho que ele está cometendo erros juvenis na administração da economia de seu país, como a tributação maciça de importações, mas é inegável o seu talento como empreendedor. Tanto sua rede social quanto a criptomoeda o teriam tornado bilionário nos últimos 5 anos. Assim, Trump criou e inventou dinheiro. 

A sexta lição é para aprendermos de tudo um pouco. Robert trabalhou em vários setores da empresa de seu pai rico para aprender um pouco de cada setor, ampliando a sua visão de toda a empresa. Quando adulto, essa postura continuou, com o autor fazendo cursos, participando de seminários e até aceitando trabalhos apenas para entender como o negócio funcionava. E aqui entra uma das (muitas) contradições da obra: enquanto o autor esnoba a educação formal de universidades (a do seu pai pobre), ele a busca em vários momentos. Talvez o ponto não seja a educação por si, mas o que fazemos dela. 

A sétima lição é que o rico sabe gerenciar o medo. O medo pode fazer com que aceitemos um emprego razoável que promete rendimentos constantes. Mas isso fecha portas e oportunidades para testarmos nossos limites e nossa capacidade. Fracassos podem inspirar vitórias. Robert rebate a percepção de que a ganância e desejos são ruins, dizendo que são condições da vida humana. Estou totalmente de acordo, apenas acrescentaria as palavras equilíbrio e responsabilidade - que tenhamos ambições, mas que elas não comprometam o equilíbrio para o nosso bem estar e que não nos force a desrespeitar terceiros.  

Finalmente, no final da obra há a mensagem para pensarmos grande. E sempre que possível, tomar ações, pois ações batem a inação. Temos de imaginar um futuro mais próspero, com desafios renovados e que estejamos nele - nosso cérebro irá trabalhar nesse sentido. Com ações consistentes voltadas para esse objetivo, teremos chances reais. 

Há pontos controversos na obra, como a afirmação de que a aquisição de moradias não é um ativo, mas um passivo. A explicação é a de que muitas pessoas perderam dinheiro com novas moradias e que quando tentaram vendê-las não conseguiram - refletindo a crise do subprime nos EUA em 2008. Por outro lado, como nos é dito ao longo da obra, uma das principais fontes de renda do autor é a compra e venda de imóveis (!). Fica confuso porque o mesmo item (imóvel) é dito não ser um ativo mas é tratado como ativo pelo autor. Eu já tinha apontado a contradição da educação. Essa do imóvel é apenas outra. E a obra tem esse problema.

Minha interpretação dessa incongruência é que como o autor negligenciou e minimizou a importância da educação, ele falhou em ter maior domínio sobre conceitos técnicos. Imóveis são ativos, mas com liquidez baixíssima - por isso não são vendidos quando o proprietário deseja. Mas isso não os transforma em passivos. Como todo ativo, o seu valor pode flutuar ao longo do tempo. Ativos podem perder valor e se desvalorizar, mas isso não os transformam em passivos. 

Outra contradição é que o autor critica o consumo desnecessário (lembre da "corrida do rato"), mas logo depois incentiva a compra de carros de luxo, como o Porsche, desde que a compra venha com juros dos ativos investidos. Para mim, tudo é consumismo. O primeiro gerando dívida e o segundo advindo de rendimentos financeiros. Mas a essência é a mesma - é o ato de comprar. Tenho nada contra quem compra carros de luxo, meu ponto é o conflito de argumentos. 

Talvez essas contradições não aborreçam o leitor. Talvez até elas ajudem a explicar o sucesso do livro. Robert escreve de forma livre, sem muitas preocupações com lógica de conceitos e definições. Não é coincidência que ele tenha escrito livros com Donald Trump e que sejam amigos - Trump tem traços desse tipo: excelente empreendedor, mas carregado de contradições e erros técnicos em seu argumento (como adiantei, o de tributar importações e achar que isso irá gerar riqueza para o país).  

Mais um talvez! Talvez eu esteja o criticando porque ele não valoriza a educação formal, e eu sou a favor e tenho educação formal. Neste caso, seria o meu viés. Mas não vejo a educação formal como um problema: muitos empresários de sucesso apostam e investem muito na educação formal, pois a interpretam como recurso indispensável para compreender o mundo sempre em mudança que vivemos. Neste caso, a educação formal funciona para melhorar nossa capacidade avaliativa, compreensiva, argumentativa e não somente pelo acúmulo de conhecimentos - sempre considerei que o ponto principal da educação formal fosse esse: melhorar e afiar nossa mente. 

De toda forma, feitas essas considerações, eu gostei da obra. Há lições boas e que de fato irão nos ajudar. Que o leitor leia a obra e avalie-a por si mesmo. 






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