sexta-feira, 11 de março de 2022

Cenário externo desafiador pressionará preços domésticos

Petrobras deveria ser "altruísta" e subsidiar a gasolina? 

guerra russia


Decorridas duas semanas da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, bem como diversas sanções direcionadas a minar a economia russa, os efeitos desses eventos estão começando a aparecer em solo brasileiro. O mais evidente, e não único, são os preços da gasolina. A tendência é a de que os alimentos se tornem mais caros, especialmente aqueles relacionados ao trigo, dado que tanto a Rússia quanto a Ucrânia são grandes exportadores dessa commodity

Os preços dos combustíveis vêm incomodando já a algum tempo. Verdade que não somente no Brasil, como no mundo inteiro. A principal explicação é a de que durante o pior momento da pandemia, os lockdowns, a demanda por combustível se reprimiu abruptamente, gerando prejuízos para as produtoras dessa commodity. Entretanto, a recuperação também ocorreu de forma rápida, com a demanda se elevando sem a adequada contrapartida da oferta de petróleo. O resultado tem sido aumento contínuo no seu preço. No caso específico do Brasil, tivemos forte desvalorização do câmbio, o que exacerbou esse aumento de preço.

Quando o preço da gasolina parecia ter dado trégua, em parte por conta de nossa inesperada valorização cambial, com a moeda flertando com o patamar de 4,99 reais por dólar, a eclosão da guerra reverteu essa calmaria. Há previsões de que o preço do barril de petróleo poderá atingir 300 dólares. Para dar uma noção do que isso pode representar para nós, lembro o leitor de que no início do ano esse barril estava cotado na casa dos 80 a 90 dólares. O valor de 300 dólares seria um choque de oferta fortíssimo. Mas como disse, é apenas uma entre várias previsões.

Neste mês outro choque relevante irá ocorrer: o aumento da taxa de juros do banco central dos Estados Unidos, o Fed. Em geral, o aumento de sua taxa de juros atrai capitais aplicados em outras localidades. A consequência é a valorização do dólar em relação às demais moedas, entre elas o real. Desta forma, pode ser que o câmbio R$/US$ volte a sofrer novas desvalorizações.

Nosso governo pode jogar pólvora nesse processo caso o desejo de distribuição de dinheiro público em ano eleitoral se acentue. Bolsonaro sinalizou que tem essa intenção. É esperar para verificar o quanto ele conseguirá entregar para o seu público. Como sempre acontece nesses casos, o câmbio responderá dependendo da magnitude do buraco fiscal. 

Para finalizar esses comentários sobre o câmbio, vou destacar um movimento que pode amenizar essa desvalorização. Como exportador de commodities, o aumento da cotação delas contribui para valorizar a taxa de câmbio brasileira. Os próximos meses mostrarão o resultado dessa mistura de tendências e choques.

Sobre a elevação do preço da gasolina, como sempre ocorre nesse tipo de situação, soluções rápidas e erradas surgiram no debate. Sem dúvidas, a pior delas é o congelamento dos preços. Abro exceção para as pessoas que não estudaram os planos econômicos heterodoxos de estabilização dos preços dos anos de 1990, os quais fornecem fortíssimas evidências para não seguir tal rota. Para quem os estudou, o congelamento deveria ser opção inaceitável. 

Então o que fazer? Caso o governo esteja realmente interessado em suavizar esse choque, a recomendação é não intervir no preço da gasolina, mas transferir renda para a população, de forma a compensar a perda de poder de compra. Desta forma, os preços continuariam refletindo escassez e preferências e estariam funcionando como âncoras que sinalizam condições do mercado - e não teríamos desabastecimento ou filas para encher o tanque.

Relacionado a esse tema, há reivindicações de que a Petrobras deveria pensar menos nos acionistas e ajudar os brasileiros (déjà-vu de Dilma Rousseff?). Vejo vários problemas nesse tópico. O primeiro é o de que se tivéssemos uma economia comercialmente aberta, não faria sentido pedir nada à Petrobras, pois outras empresas estariam prestando serviço similar. Teríamos, em uma palavra, um mercado mais competitivo. 

O segundo é a lição não aprendida com Dilma Rousseff, a qual procedeu de forma similar e colocou a estatal próxima da insolvência. Rousseff utilizou a Petrobras para subsidiar a gasolina, prejudicando suas contas.

Terceiro. Como uma empresa de capital aberto (possui ações na bolsa de valor), é normal que a Petrobras remunere os seus investidores, o que ocorre na forma do pagamento de dividendos. É um ciclo: investidores compram ações da empresa; esta utiliza esse capital para ampliar suas atividades; o lucro advindo dessas operações é em parte repassado para os indivíduos que assumiram o risco de investir na empresa. Nada de novo. 

Por fim,  essa pressão sobre a empresa mostra o quão inadequado é o nosso sistema político. Principalmente por conta desse fator (há outros, mas esse é o essencial), eu sou a favor da privatização de estatais. O meio político as utilizam como forma de angariar apoio, seja com cargos e/ou políticas para beneficiar determinado eixo da população. Há uma separação entre a eficiência de mercado com a sua utilização para ganhos privados de políticos. Quem perde é o contribuinte que arca com impostos para financiar essa politicagem.

Conforme a guerra se arraste por mais tempo, os efeitos sobre os preços tenderão a ser piores. O mesmo a respeito das sanções à Rússia: elas não atingem somente a economia russa, mas todo o mundo, uma vez que vivemos em um mundo globalizado e integrado financeiramente e comercialmente. Não se iluda com sanções que derrubem o rublo (moeda russa) e o mercado acionário russo. Essa mesma sanção nos machucará. É torcer para que essa possível piora no cenário não incentive nossos políticos a distorcerem ainda mais a economia.











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