E desafiadora em um mundo que nos empurra para consumir
Eu acredito que poupar parte de nossa renda seja uma qualidade moral positiva, talvez até um traço de caráter e personalidade, o qual dialoga com a paciência e a prudência – prudência desde que a poupança não seja investida em ativos e oportunidades hiper arriscadas e com altíssimo risco de não funcionar.
Somos bombardeados pela TV, pelas telas de celulares e pelo ambiente urbano com inúmeros anúncios incentivando o consumo. Mais do que isso, relacionando-o com satisfação, felicidade e completude. Todos artistas em propagandas sorriem, mostram felicidade. “Consuma para também ser assim!” Nossos círculos sociais possivelmente colocam mais pressão sobre o consumo e o gasto. Comprar ou trocar de carro, viajar para lugares marcantes, adquirir algum procedimento estético, comprar determinada roupa – as possibilidades de consumir são muitas.
Mas quem elogia, incentiva e promove o ato de poupar? O ato de postergar, de dizer não ao consumo? Ao ato de apontar que iremos sacrificar um benefício no presente para colher algo melhor e mais razoável no futuro? Mas que futuro? E o que dizer da dopamina?! Já leu sobre alguém poupar e isso gerar dopamina? Se sim, acredito que sejam raros os casos. Mas consumir e elevar a dopamina, momentaneamente, dado que quase todo ato de consumo é fugaz, pois o aumento na felicidade e saciedade são transitórios. Há pouca torcida para a poupança, ao passo que para o consumo há todo um planeta incentivando-o.
Eu concordo que é difícil dizer não ao consumo e sim à poupança. Ganhamos nada no presente com a economia de recursos, mas ganhamos algo concreto com o consumo. O componente temporal não joga a favor da poupança – poupança envolve vários períodos, o longo prazo. E o que sabemos do longo prazo? E desde quando poupar sufoca a dor que vivemos? Já viu em algum filme o rapaz com coração partido que resolveu poupar para ter um alívio da dor? Não. Mas sempre vemos pessoas tristes consumindo para aliviar a dor.
Concordo com a afirmação de que, no geral, com algumas exceções, somos curto prazistas, queremos o prazer agora, e não no futuro. Também há evidência de que as últimas gerações são mais ansiosas do que as passadas, piorando ainda mais a disciplina de poupar. Finalmente, o marketing tem progredido muito, utilizando nossos vieses cognitivos e emocionais para nos conduzir a comprar mais e mais.
E o que dizer de nossas inseguranças? Quem nunca consumiu pensando em elevar o seu valor social? O candidato óbvio costuma ser o carro ou viagens luxuosas, juntamente com roupas caríssimas. Compensar a falta interior com bens exteriores. Não funciona, mas isso é impeditivo para nós? E que fique registrado que eu assim já agi! E pense ainda no efeito das redes sociais, que aumentaram ainda mais a comparação entre nós!
Dadas essas considerações, eu avalio que poupar é se colocar contra toda essa máquina social que nos empurra para consumir (e nunca ficar totalmente satisfeito com o consumo realizado). É se posicionar dizendo que acredita no futuro, na paciência, no freio aos nossos impulsos e ambições. É ter disciplina de cortar gastos aqui e ali para que surja espaço no orçamento para investir. Deve-se ser assertivo para poupar, pois me parece que se deixarmos no automático, nossa renda tenderia ao consumo.
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