sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Resenha: Como Ser um Conservador (Roger Scruton)

Autor ajuda conservadores a se posicionarem em pautas delicadas e controversas

roger scruton


Como prometido na resenha de Conservadorismo: Um Convite à Grande Tradição, aqui estou fazendo a resenha de Como ser um Conservador. Enquanto o primeiro livro se preocupou em demarcar e contextualizar o surgimento do movimento conservador, o segundo foca na sua definição e nas aplicações de suas teorias frente às principais questões contemporâneas.

No início da obra, Roger Scruton conceitua o que seria ser uma pessoa conservadora. É aquele indivíduo que interpreta a sociedade como "nós", que percebe a importância de instituições herdadas do passado, a partir das quais foi possível avançar na vida em conjunto. Portanto, o conservador se preocupa com mudanças, pois deseja conservar o que funcionou, o que exerceu a função de âncora para guiar os passos dados. Todavia, isso não significa que o conservador seja contrário às mudanças. Ele aceita mudanças, mas desde que estas não coloquem em risco valores e tradições que auxiliaram na emergência da sociedade na qual vive. 

Um ótimo exemplo foi dado no livro Conservadorismo, quando Scruton afirmou que o movimento conservador surgiu para frear os excessos do liberalismo. Resistências a esses excessos são facilmente identificadas atualmente, como o pleito pela eliminação completa da estrutura governamental - frases do tipo "imposto é roubo" ajudam a identificar esse tipo de protesto. De outro lado, o socialismo almeja estatizar toda a estrutura produtiva, centralizando o comando sob o governo. Conservadores se posicionariam, segundo Scruton, para barrar esse tipo de ofensiva. Entretanto, enquanto barrando, aceitariam algumas alterações, visto como desejáveis para a sociedade. No caso do liberalismo, maior competição entre empresas e maior liberdade para indivíduos. No tocante ao socialismo, fornecimento de bens públicos pelo Estado, como educação e saúde. Em uma palavra, o conservadorismo conseguiria intermediar essas correntes, bloqueando movimentos radicais. 

Mas esse ponto é delicado. Se posicionar contra determinadas mudanças pode ser visto como comportamento reacionário, sexista, racista ou preconceituoso. Scruton está ciente dessas denominações. Ele conecta essa discussão com o politicamente correto. Para o autor, na luta por espaço no campo político, a ascensão do politicamente correto representaria o enfraquecimento do conservadorismo. Nessa parte, histórias pessoais de perda de espaço em universidades são contadas para reforçar a perda de espaço de conservadores em instituições de ensino e de pesquisa. 

No Brasil, esse tema envolve fortes controversas. Tenho amigos que reclamam de que atualmente "não se pode falar nada". O episódio com o jogador de vôlei Maurício, seu comentário a respeito do Superman beijando outro homem, e a sua subsequente demissão causaram tumulto nas redes sociais. Tenho a impressão que há uma confusão entre expressar a opinião e expressar crime de ódio, o que configuraria crime de homofobia.

Após a delimitação do termo conservador, o restante do livro apresenta o que significa nacionalismo, socialismo, capitalismo, liberalismo, internacionalismo e ambientalismo para o conservador. Aqui o livro se justifica: Scruton cria diálogos entre o movimento conservador com esses temas, ressaltando pontos nos quais os conservadores concordam, e onde estes se posicionam de forma contrária.

Destacarei o capitalismo. Scruton reconhece que a propriedade privada e uma economia de trocas livres são ferramentas indispensáveis para sociedades cada vez mais complexas. O conservador deveria reconhecer e aceitar essas características nos mercados. Hayek é citado como suporte para o raciocínio, o qual argumentava que os preços transmitiam informações criadas por milhões de pessoas. Os preços reúnem o conhecimento das preferências da população e da escassez de bens e serviços. Com base nos preços, podemos tomar decisões que melhor atendam nossas necessidades. O mercado, portanto, seria um alocador por excelência dos recursos.   

Por outro lado, Scruton denota que o capitalismo tende a precificar e a transacionar tudo, inclusive o que não é, por definição, transacionável, ou não deveria o ser. Exemplos são: casamento, família e sexo. Desta forma, enquanto conservadores deveriam apoiar os mercados, dados os benefícios que são gerados, deveriam barrar o crescimento do mercado quando este tentasse entrar em esferas não transacionáveis. (Harari faz uma crítica parecida no seu livro Sapiens: Uma Breve História da Humanidade). 

Sobre o socialismo, Scruton reconhece a boa intenção de tornar a sociedade mais igualitária, todavia, há vários equívocos, principalmente nos métodos empregados. Além da estatização da propriedade privada, ressaltada anteriormente, o autor nos diz que socialistas partem de uma concepção errada de como funciona os mercados. Pensam que é um jogo de soma zero, no qual empresários bem sucedidos estariam tomando o que seria dos trabalhadores. Erro herdado do livro de Marx, O Capital, no conceito de mais-valia.

Outra crítica é a da ânsia de impor tributos sobre a população. Segundo Scruton, todo imposto representa uma violação da propriedade privada, portanto, deveria ser cuidadosamente implementado, embora este deva existir para financiar a estrutura governamental que impõe a ordem civil e protege a população de ameaças externas - estas duas sendo as principais funções do governo. Por fim, há a confusão entre igualar oportunidades com resultados. Igualar oportunidades promove benefícios, enquanto igualar resultados é um traço ainda existente do socialismo do século passado.

O livro tem como ponto forte os diversos comentários do autor sobre diferentes temas de interesse dos conservadores. São críticas bem colocadas e embasadas. Pode-se não concordar com a conclusão, mas é difícil não aceitar algumas das hipóteses que levaram a esta conclusão. Como eu disse na primeira resenha que fiz deste autor, este livro é recomendado para aguçar argumentos políticos e a ajudar a se posicionar em questões controversas. 





 






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