quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Resenha: Freakonomics (Steven Levitt e Stephen Dubner)

Livro ensina e incentiva a questionarmos sabedorias convencionais

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Freakonomics é um dos livros mais populares entre alunos ingressantes no curso de Ciências Econômicas. Lembro quando eu era aluno de graduação, em 2009, e o professor que ministrava macroeconomia recomendou a leitura desta obra. Recordo da empolgação de meus colegas com os capítulos e achados, muitos destes totalmente inesperados dado o problema inicial. Esse é um dos pontos fortes de Freakonomics: oferecer respostas "escondidas" para problemas evidentes. O subtítulo reforça esse traço, Freakonomics: O Lado Oculto e Inesperado de Tudo que nos Afeta.

Não li a obra em 2009. Tomei mais tempo. Foi por volta de 2012 que a li. E como meus colegas, também fiquei impressionado com as conclusões dos estudos mostrados. Freakonomics utiliza ferramentas econômicas para resolver problemas não-econômicos, questões do dia-a-dia. Criminalidade, corretores de imóveis, professores de educação básica, lutadores de sumô, entre outros, são alvos da análise de Steven Levitt. Levitt realizou os estudos apresentados, enquanto Dubner foi o repórter que tornou a carreira de Levitt famosa para além dos muros do mundo acadêmico. O livro rapidamente se tornou um best-seller no New York Times. Recentemente, A revista The Economist recomendou 5 livros para compreender a cabeça de economistas. Obviamente que entre eles constava Freakonomics. Caí na nostalgia de relembrá-lo e o reli novamente, e aqui está a sua resenha.

O ponto central do livro é como os incentivos moldam o nosso comportamento. Consequentemente, se conseguimos entender e visualizar os incentivos dos indivíduos envolvidos em determinada situação, podemos aumentar nossa compreensão. O capítulo que mais destaca a influência do incentivo é o relativo aos corretores de imóveis. Os autores mostram se deveríamos confiar totalmente neles quando desejamos vender nossas propriedades (não darei spoiler porque um dos atrativos do livro é perceber as conclusões dos capítulos). A avaliação desta questão ocorre pela comparação entre o tempo e o valor que agentes imobiliários gastam quando tentam vender imóveis próprios, em detrimento de quando se esforçam para vender imóveis de clientes. Dado que agentes imobiliários recebem comissões pela venda de residências de clientes, deveríamos esperar grande esforço da parte deles, certo? O que diz os dados? Freakonomics abre os dados e desvenda essa questão.

Incentivos estão permeados em praticamente todas as transações em uma economia. Não é por menos que, entre os 10 princípios da Ciência Econômica, elencados por Mankiw no livro Introdução à Economia, os incentivos estejam lá. Quando autoridades desejam alterar o resultado de algum evento, elas precisam alterar os incentivos que as pessoas enfrentam. Sempre respondemos a incentivos.

Os incentivos se dividem em monetários, sociológicos e morais. A parte monetária é mais clara, enquanto os outros dois costumam ser mais difíceis de serem identificados. Muitas vezes não há incentivo financeiro envolvido, entretanto, somos "coagidos" pelas forças "invisíveis". Investigação interessante é quando um vendedor de baguetes entrega todos os dias uma quantidade do pão nas empresas e deixa um jarro para quem consumi-los depositarem o valor. Essas pessoas seriam honestas e pagariam? Ou apenas consumiriam o pão sem pagar? Há diferenças de pagadores entre funcionários altamente bem-remunerados de outros com salários padrões? Observe que não há uma fiscalização clara. Um dos resultados foi o de que 87% das pessoas pagavam pelo consumo, enquanto o restante 13% tirava vantagem do esquema baseado na confiança e no senso moral. O que esses valores sugerem?

Além do enfoque nos incentivos, o livro se concentra na sabedoria convencional, efeitos escondidos, especialistas e utilização de dados. Sabedoria convencional é um termo que elucida a opinião majoritária, não necessariamente correta, de algum tema. Por exemplo, temos a informação de que crianças que vivem em residências com maior quantidade de livros tiram melhores notas na escola. Logo, a sabedoria convencional nos diz que aumentar o número de livros nas casas elevaria o desempenho escolar destas crianças, certo? A resposta é negativa. Acontece que este é um exemplo da confusão entre correlação e causalidade. Duas coisas podem andar conjuntamente (livros e notas), mas isso não significa que livros causam maiores notas. Correlação e causalidade é outra questão trabalhada de forma muito didática. O capítulo relativo à educação das crianças merece uma leitura cuidadosa para percebermos como caímos na armadilha da sabedoria convencional.

A parte dos efeitos escondidos, especialmente no capítulo que explica a queda da criminalidade nos Estados Unidos nos anos de 1990, realça tanto as falhas da sabedoria convencional quanto o quão difícil é compreender alguns fenômenos. Geralmente explicações intuitivas e de fácil compreensão são aceitas pela população (eu incluído, leitor (a); na primeira vez que li Freakonomics, eu também escorregava e percebia como sempre aceitei a sabedoria convencional). Os autores oferecem as principais explicações para a queda da criminalidade, e mostram o mérito delas (algumas eram relevantes, de fato). Todavia, o fator central se escondia. A controvérsia que girou por muitos anos envolta do livro se deve a este capítulo e à sua conclusão.

Podemos sempre confiar nos especialistas? De acordo com o livro, deveríamos ficar atentos. O livro mostra exemplos nos quais especialistas utilizam as informações que possuem para obter vantagem própria. Por definição, um especialista tem melhores dados e informações na área em que atua, caso contrário não seria um especialista. A ascensão e popularização da internet reduziu um pouco a discrepância informacional. Hoje temos acesso rápido a vários tópicos. Uma consequência mostrada é a queda do preço de seguros.

Com dados corretos e esforço em extrair informações deles, podemos simplificar e desmistificar questões complicadas no mundo. O capítulo sobre as gangs de crack de Chicago mostra se traficantes ganham muito dinheiro com a atividade. Uma das conclusões é a de que a estrutura do tráfico se parece muito com a de uma empresa padrão, com o conselho de diretores, gerentes e franquias - e também com a distribuição dos rendimentos. 

Os nomes que temos afetam nosso futuro profissional e financeiro? Essa e outras questões são abordadas durante a leitura. Talvez a abordagem de temas incomuns tenha sido uma das âncoras que fizeram com que Freakonomics se tornasse um sucesso. Junte esse ponto com uma escrita por vezes cômica e didática, e teríamos já um livro bom de ser lido. O rigor técnico, que não torna em momento algum a leitura chata e monótona, é a cereja do bolo. Freakonomics, por mostrar a força dos incentivos em situações costumeiras e desvendar efeitos escondidos, é leitura que ajuda a compreender o mundo que vivemos e a forma como economistas pensam.








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