sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Entrevista de Lula na The Economist

Lula mostra que PT pouco aprendeu com os seus erros do passado

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Assim como escrevi alguns comentários da entrevista concedida por Lula na revista Times (texto aqui), faço o mesmo com a mais recente entrevista realizada por ele na revista The Economist. Em comparação com a entrevista na Times, desta vez o ex-presidente resolveu falar sobre economia (na Times, Lula desqualificou a importância de discutir políticas econômicas antes das eleições e deu a super, mega, hiper mancada de atribuir responsabilidade igual tanto para Vladimir Putin quanto para Volodymyr Zelensky pela eclosão da guerra entre a Rússia e a Ucrânia).  

Por outro lado, seria no mínimo estranho uma negativa de Lula em discutir economia na principal revista de economia do mundo. Um breve resumo (desanimador) é o de que Lula insistirá no programa econômico com a marca petista: aumento da intervenção do Estado na economia. Um paliativo é o de que, como foi visto no primeiro governo de Lula, entre 2003-2006, ele pode tomar uma abordagem mais pragmática, uma vez eleito. Neste caso, amenizaria os danos que possam vir a ser cometidos. 

No início da entrevista, Lula relembrou que durante os 8 anos como presidente, a economia brasileira teve crescimento forte do PIB e significativa redução da pobreza. Ambos os indicadores estão corretos. Todavia, faltou reconhecer que parte deste sucesso adveio das reformas estruturais implementadas por Fernando Henrique Cardoso (FHC), como a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), as privatizações, criação de agências reguladoras, saneamento do setor bancário, o regime de metas de inflação e o tripé macroeconômico. Também teve a omissão do boom das commodities, puxado principalmente pela China e pela Índia, o qual elevou as receitas do governo. Lula surfou nesta onda. 

Agora a parte preocupante. Lula tem a intenção de fortalecer os bancos públicos para puxarem o crescimento do país. Neste caso, o governo iria expandir o crédito público direcionado e subsidiado. No passado, a gestão petista empregou esta estratégia, com vários fracassos, sob a alcunha de "campeões nacionais". Lula se defendeu argumentando que este crédito iria para as pequenas e médias empresas. 

Afirmou que os pobres voltariam a entrar no orçamento. Há previsões de elevações em programas contra a pobreza. Como o orçamento do governo está esticado até as pontas, a saída seria reformar o teto do gasto e criar novas formas de tributação. Para este intuito, a hipótese de tributar as grandes fortunas foi alçada. Tenho ceticismo com todo este parágrafo.

Assim como a revista observou, eu faço o mesmo. A raiz dos nossos problemas fiscais e econômicos reside na ausência de reformas estruturais que possam destravar a economia. Infelizmente Lula pouco tocou nestes pontos. Não causa surpresa, pois nos 8 anos como presidente, ele não avançou pautas que poderiam tornar o forte crescimento do produto em algo duradouro e sustentável. Quem adotou essa trajetória foi FHC, mas este não colheu os frutos. Coube a Lula se beneficiar do esforço passado. Como Lula não prosseguiu com essas reformas, ele comprometeu o desempenho da presidente que o sucedeu, Dilma Rousseff. Esta é uma das principais críticas que tenho com o PT: ele não enxerga a imperiosidade de reformas estruturais para tornar nossa economia vibrante e moderna. Pensa somente em expandir a participação do governo na economia. Uma visão obsoleta de desenvolvimento econômico.

No auge do governo Lula, mesmo com sua popularidade próxima de 90%, ele não se esforçou em fazer reformas pouco populares, como a da previdência, administrativa, tributária, de abertura econômica e fiscal. Adiciono ainda que os partidos de oposição apoiariam estas reformas, pois o "Mensalão", esquema de compra de votos petista, garantiria o apoio parlamentar. Lula tinha maioria para aprovar quaisquer reformas.

Como se vê, um dos alicerces do programa de Lula é o aumento da demanda agregada, isto é, o aumento do consumo privado, do gasto do governo e possivelmente do investimento público. Nossos vizinhos têm esta marca: apostam na demanda para fomentar o crescimento da produção. No curto prazo, os resultados costumam agradar, mas no longo prazo, os problemas e limitações desta prática abundam. Nenhuma palavra sobre melhorar o ambiente institucional e macroeconômico. O PT continua não fazendo autocrítica da bagunça que causou durante sua gestão com apostas equivocadas, centradas no aumento do gasto público, e pela ausência de reformas estruturais. Igualmente, não há autocrítica das práticas de corrupção. Em uma palavra, é como se não tivesse ocorrido aprendizado com os erros passados. 

Sobre a corrupção, Lula disse na entrevista que o PT está cansado de se desculpar pela corrupção. Novamente sigo a observação da reportagem: o PT nunca se desculpou formalmente pelos roubos aos cofres públicos promovidos tanto pelo Mensalão quanto pela Operação Lava Jato. Lula foi preso exatamente por conta deste último esquema de suborno, propina e lavagem de dinheiro.

Quem acompanha este espaço sabe que critico tanto Lula quanto Bolsonaro. Me sinto confortável com o que escrevo sobre eles porque de fato não vejo em nenhum deles um caminho viável para solucionar nossos problemas (econômicos). Quando sou acusado de ficar em cima do muro, não hesito: considero Bolsonaro pior político. Apenas a forma como ele lidou com a pandemia é um verdadeiro e inconteste fatality para considerá-lo um presidente apto (comparado com o motivo que gerou o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, vejo este como muito mais forte). Recentemente, saiu nos jornais que a família Bolsonaro comprou 51 imóveis com dinheiro vivo em uma economia que caminha para o dinheiro digital. Converse com profissionais do ramo imobiliário e contraste esta informação. Pergunte o que acham desse tipo de transação. Obviamente que é legal utilizar dinheiro vivo para comprar quaisquer bens. Mas por que você sacaria quantias de 500 mil reais para comprar imóveis? Ah, claro, o dinheiro não foi sacado, pois não estava no sistema. Então de onde veio?

E aqui volto para Lula. Após minha leitura do livro A Organização, tomei nota de várias formas pelas quais a corrupção pode ocorrer. Uma delas é justamente não colocar o dinheiro no sistema, pois ele se torna rastreável e identificável. Assim ocorreu com a Lava Jato, com Lula sendo pego pelo triplex (no livro, há indícios de recebimento de muito mais). Eleitores que condenam Lula pela prisão, por conta do triplex, não deveriam negligenciar os 51 imóveis da família Bolsonaro. 

Enfim, a entrevista de Lula confirmou receios que eu já nutria em relação a um possível retorno do governo petista. A esperança é que Lula se comporte de maneira muito pragmática, evitando implementar suas ideias, que são pouco eficazes. Veja só: o melhor cenário seria um presidente pouco ativo, omitindo em cumprir promessas. Pobre Brasil.









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