terça-feira, 21 de outubro de 2025

Resenha: Nosso Dólar, Seu Problema (Kenneth Rogoff)

Dólar reinará para sempre?

nosso dólar, seu problema


Kenneth Rogoff é um conhecido macroeconomista. Fez carreira acadêmica com publicações famosas e também trabalhou em instituições multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), como economista chefe. Além disso, é participante ativo de conferências internacionais. No passado, publicou o famoso livro Desta Vez é Diferente, juntamente com Carmen Reinhart. 

Nosso dólar, seu problema, mostra amadurecimento de Rogoff como autor. Quando li Desta Vez é Diferente, senti que o livro parecia um artigo científico ampliado - linguagem fria e pouca interação com o leitor. Felizmente, Rogoff mudou e nos apresenta uma obra muito mais agradável de ser lida. 

O objetivo do livro é explicar o porquê do dólar ser a principal moeda do mundo e mostrar os riscos que isso acarreta - há vantagens, mas como sempre acontece na economia, há riscos também. Sem almoço grátis, nos ensinava Milton Friedman

O dólar tem esse domínio por 5 fatores.

O primeiro são os mercados financeiros dos Estados Unidos (EUA). O termo técnico usado por Rogoff é profundidade. Profundidade denota que esses mercados são amplos, com fácil participação, muita liquidez, muitas opções de ativos e com pouca restrição para transações. Isso impulsiona o uso do dólar, pois ele pode ser facilmente transacionado, ou seja, vendido e comprado. 

O segundo fator é a posição privilegiada que os EUA tiveram após a Segunda Guerra Mundial. Com as principais nações parcialmente destruídas pela insensatez da guerra, os EUA proviam o mundo com suas mercadorias e capitais. Estimativas mostram que o PIB dos EUA representava mais de 50% de todo o PIB mundial, além de inundar países com suas mercadorias, a famosa produção em massa, que também puxava o consumo em massa. Logo, mercadorias vendidas pelos EUA eram marcadas em dólares, difundindo a moeda. 

O terceiro fator, apesar da política recente de Donald Trump em proteger a indústria nacional, é que os EUA ainda são muito integrados comercialmente e financeiramente com os demais países. Essa integração facilita o uso do dólar, moeda universal e aceita em todas as transações. 

O quarto fator é o Estado de Direito, o arcabouço que rege as leis e ordem do país. No caso do dólar, não há o risco de que ele desapareça, ou que os EUA não honrem compromissos baseados na moeda. 

O quinto fator é a força militar, espalhada no planeta com várias bases. Rogoff reconhece que existe uma relação entre o poderio militar e a predominância da moeda: vimos isso nos séculos passados, quando a Inglaterra dominava os mercados e o fronte militar. 

Eu citaria outros fatores, como a baixa depreciação do dólar ao longo do tempo, ou seja, baixa inflação, e o comportamento de manada. Enquanto a baixa depreciação protege o valor do dólar (compare a perda de poder de compra que temos com o real brasileiro), o comportamento de manada incentiva o uso de dólar, pois se todos o estão usando, cria-se o incentivo de que tantos outros também o utilizem. Digo mais, por acreditarem no poder do dólar, essa crença faz com que ele seja de fato forte.

Para reforçar meu ponto. Mesmo pessoas que odeiam os EUA, como Nicolás Maduro e Osama Bin Laden, usam (usavam) sem embaraço e com muito bom gosto o dólar. Reflita comigo, você acha que Maduro colocaria sua fortuna na moeda venezuelana? Sabe o nome dela? Não? É bolívar. No caso do Afeganistão, Osama mantinha sua riqueza em afegane, a moeda do país? Não, esses senhores são homens práticos. Usavam o dólar. Tanto pela convertibilidade, aceitabilidade e baixa perda de poder de compra.

Se todos usam e gostam do dólar, ele continuará sendo a moeda principal do planeta. Simples assim.

Há 3 benefícios que o domínio do dólar traz para os EUA. A taxa de juros sobre a dívida é menor do que seria no caso de ausência de domínio do dólar, o governo pode tomar dinheiro emprestado de forma quase ilimitada e o país pode impor sanções financeiras, como tem feito com a Rússia, embora com baixa eficácia. 

Claro, há riscos. O principal risco destacado no livro é o de que o dólar perca a proeminência de que desfruta. Neste cenário, a dívida pública, já alta, enfrentaria maior taxa de juros, piorando as contas públicas do país e provavelmente colocando a economia na rota de uma imensa crise financeira. Rogoff é muito pessimista neste ponto.

É também um forte crítico ao crescente endividamento do país. Tanto democratas quanto republicados parecem não se preocupar com o aumento da dívida pública - talvez porque a taxa que financia essa dívida esteja baixa. Mas isso pode mudar.

E se mudar, o preço será alto.

Não somente para os EUA, como também para todos nós - o que ocorre nos EUA espirra em todo o planeta. O dólar é deles, mas o problema é nosso também.

Há moeda que rivalize com o dólar? Parece que não. O euro poderia, mas problemas de união fiscal e política o enfraquecem. O Japão com o iene poderia ameaçar o dólar, mas o Japão enfrenta décadas de baixo crescimento, o que foi cunhado de estagnação secular. A China ameaçou por um tempo, mas o país tem crescido menos nos últimos anos, além de acumular problemas econômicos.

Parece que o caminho para o domínio do dólar continua livre. 

Dados para fortalecer esse ponto: das 150 moedas que existem atualmente, 90% de todas as transações cambiais ocorrem com dólares. Quer mais? De todas as reservas internacionais dos bancos centrais, 60% são mantidas em dólares. Vida longa ao dólar?

Além dessa discussão, o livro realiza tantas outras, como a vantagem do câmbio flexível sobre o câmbio fixo, crises financeiras, em especial a asiática, e os problemas econômicos da China.

Ponto interessante é que Rogoff participou de vários eventos internacionais, como crises. Ele nos revela conversas de bastidores e curiosidades adicionais. Isso enriquece muito a leitura. 

O livro é escrito em linguagem clara e objetiva. Rogoff é excelente argumentador. Sem dúvidas, o leitor sairá com maior conhecimento sobre a economia mundial, macroeconomia e o sistema financeiro.

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