segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Déficit Comercial é um Problema?

Pode ser, a depender de outros indicadores

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A pergunta do título tem assombrado a cabeça do presidente dos EUA, Donald Trump. Desde que assumiu a presidência, no início desse ano, Trump tem assustado o planeta com sua política de tarifar as importações de praticamente todos os países.

O Brasil não escapou. Recebemos uma tarifa de 50%.

Até mesmo ilhas inabitadas por humanos foram taxadas. Neste caso, os seus moradores, inocentes pinguins, foram taxados. 

O primeiro passo é entender o que é déficit comercial. 

Déficit comercial ocorre quando as importações de bens e serviços superam as exportações de bens e serviços. Os EUA tem déficit comercial com a China porque os americanos importam mais mercadorias dos chineses do que exportam. 

É realmente um problema ter déficits comerciais?

Não, meu caro, não é um grande problema.

A resposta depende da conjuntura, fundamentos econômicos e desempenho da economia.

Quando analisamos quão bem um país está, do ponto de vista macroeconômico, devemos olhar para os seguintes indicadores:

1) Crescimento econômico (aumento do PIB)

2) Nível da inflação 

3) Níveis das taxas de juros

4) Taxa de câmbio

5) Investimento/PIB e Poupança/PIB

6) Contas fiscais

7) Contas externas (aqui entra o déficit comercial)

8) Progresso tecnológico

9) Dinamismo da economia (criação de novas empresas, novas vagas de trabalho, comportamento do mercado de ações)

10) Burocracia e regulação (aparato institucional)

10 indicadores!

E por que Trump foca somente no déficit comercial?

Na minha opinião, Trump foi levado por parte do debate que considera o déficit comercial um grande problema. 

O déficit comercial está inserido nas contas externas, que se dividem em transações correntes e conta capital. Se há déficit comercial, então possivelmente o país terá um déficit na conta corrente, gerando um déficit corrente.

Por pura contabilidade, o país terá a conta capital positiva, portanto, terá superávit na conta capital. Devemos somar o déficit corrente com o superávit na conta capital. Se o resultado for positivo, o país terá um saldo externo positivo, com o acúmulo de reservas internacionais. 

Tudo bem?

Depende.

Como o país tem déficit na conta corrente, ele se endivida com capital internacional (é o superávit na conta capital). Como toda dívida, e essa dívida é em moeda estrangeira, ela deverá ser paga com o acréscimo de juros. Problemão?

Depende de novo!

Se o país usa esse financiamento para se tornar mais produtivo, então o país se torna mais rico e possivelmente conseguirá pagar a dívida internacional sem problemas. 

Veja que nesse caso o déficit comercial (que está dentro do déficit corrente) se converte em maior produção e produtividade.

E esse parece ser o caso dos EUA, pois o país tem crescido relativamente bem nos últimos anos, gerando inovações tecnológicas e produzindo empresas de alcance global.

Se o déficit comercial fosse um problema, deveríamos notar queda significativa no desempenho dos EUA. Mas não é o que os dados mostram. 

Mesmo o acúmulo de déficits comerciais com alguns países também não é um problema. Faz parte do funcionamento de economias a ocorrência de déficits e superávits comerciais. 

Nunca foi um problema.

O problema é se o país vacilar nos pontos que elenquei acima - incluindo acúmulos de déficits comerciais.

Neste caso, o país tenderia a ter dívida crescente, queda do crescimetno econômico, taxas de juros altas, depreciação cambial persistente e parcas reservas internacionais (o Brasil tem alguns desses problemas).

Em outras palavras, o país caminharia para uma crise fiscal. Ou crise de confiança. Ou crise da moeda. 

Inevitavelmente, o resultado seria ruim. 

A ideia de que déficits comerciais é ruim vem do mercantilismo, sistema de produção que vigorou nos séculos XV e XVIII (1500 a 1799). 

No mercantilismo, países tomavam medidas, como a imposição de tarifas comerciais, para proteger empresas nacionais, reduzir as importações e gerar superávits comerciais. Tudo o que Trump sonha em fazer.

O mercantilismo caiu, pois a teoria estava incorreta e a sua prática era insustentável (imagine o cenário no qual todos os países se retaliam com tarifas: teríamos a paralização do comércio internacional). 

Trump me parece ter nostalgia do mercantilismo.

Todavia, como informou o jornal The New York Times, os EUA tem obtido altíssimas receitas fiscais advindas das tarifas aduaneiras. Essas receitas ajudarão o país a lidar com sua dívida pública e déficit público. Talvez a intenção de Trump desde o início tenha sido essa: tarifas para fechar as contas fiscais.

Mas também nesse caso o uso de tarifas não é muito bom.

Tarifas são impostos, que elevam o custo de vida das pessoas e desaceleram a economia. 

Quem diria que um político republicado (com inclinação política de direita) teria tanta inclinação para tributar!

Portanto, ter déficits comerciais não é um problema. Devemos nos atentar para a imagem geral do país, incorporada pelos 10 indicadores acima. 

Caso o país mostre indicadores insatisfatórios, então há problemas com a economia (é o caso do Brasil). Mas olhar somente para o déficit comercial é um retrato incompleto.

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Como novidade do Velha Economia, estou criando vídeos no Youtube, no canal do Velha Economia. Fiz um short para esse artigo:











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