Sucesso que geram no curto prazo não compensa o prejuízo que chegará no futuro
Hoje discutirei leis que limitam o reajuste de aluguéis.
A ideia é não permitir que proprietários reajustem ou estabeleçam valores de
aluguéis muito elevados. A motivação dessa medida, em geral, e o raciocínio,
incorreto na maioria das vezes, é a de que os proprietários estão abusando dos
inquilinos, explorando-os, cobrando aluguéis injustificáveis. Há um erro na
causalidade ao impor leis deste tipo: o de que os altos aluguéis causam o alto
custo de viver nas cidades. O que ocorre é o contrário: o alto custo da cidade
joga os aluguéis para cima.
Os primeiros meses de vigência dessas leis passa a ilusão de
que a medida foi acertada, pois os preços de aluguéis irão cair – a inflação da
cidade e, portanto, o custo de viver nela declinará. Dessa forma, podemos dizer
que no curto prazo a lei que limita o preço de aluguéis funciona. O problema
surge nos meses e anos subsequentes, quando o reajuste do aluguel, que passa a
ser controlado pelo governo e políticos, não acompanha o desejo dos
proprietários das residências. Ocorrerá desestímulo em investir e construir
novos apartamentos e casas, pois o retorno do investimento na forma do
recebimento de aluguéis foi reduzido. Em outras palavras, a oferta de
apartamentos irá se reduzir. Mas e a demanda?
A demanda por moradias continuará crescendo na velocidade de
antes da lei, portanto, em crescimento contínuo. Mas se há quantidade cada vez
menor de apartamentos, teremos um descompasso entre oferta de moradias e a
demanda por elas. Sem a lei que limita os reajustes, teríamos aumento no preço
dos aluguéis. Todavia, como essa opção está descartada, teremos escassez e
falta de moradias (e filas de espera). Consequências típicas de controle de
preços.
Eu estou escrevendo sobre esse tema porque recentemente,
aqui na cidade de Mariana-MG, cidade histórica, universitária, e alvo de
atuação de mineradoras (Vale, Samarco) – com o adicional de empreiteiras
refazendo moradias das vítimas dos desastres causados pela Vale -, o preço de
aluguéis disparou para valores absurdos. Absurdos no sentido de considerar que
Mariana é uma cidade de interior com mais ou menos 60 mil habitantes, pouco
industrializada e com economia pouco moderna. Em suma, uma cidade do interior
brasileiro. Por exemplo, há kitnets (minúsculas) no valor de 2 mil reais para alugar – e há
quem pague o valor!
Aluguéis exorbitantes geraram o clamor da população.
Políticos ouviram e criaram um projeto de lei que... limita e controla o nível
dos aluguéis (enquanto escrevo, o projeto está em fase de aprovação). Quando
fui informado desse projeto, em uma roda com marianenses, todos se mostraram
contentes. Afirmaram que o problema dos aluguéis será resolvido. Eu pensei em
objetar, mas tamanha a empolgação dos envolvidos, eu desisti.
Limitar os preços causa problemas não somente no mercado
imobiliário, como também em outros mercados. O salário mínimo é outro exemplo
de controle de preços. Escrevi anteriormente sobre ele, fazendo algumas
críticas (aqui e aqui) – fui criticado por alguns leitores. Mas o ponto é que o salário
mínimo é um preço, o preço da mão de obra, que é imposto pelo governo. Sem o
governo, a oferta de trabalhadores e a demanda de contratação das firmas
iria gerar o salário de equilíbrio. No caso brasileiro, seria mais baixo
que o salário mínimo. Daí o problema do salário mínimo: gera descompasso
entre a oferta e a demanda, culminando em desemprego, pois muitas firmas não
conseguem (não têm capacidade financeira) pagar salários neste nível. O Brasil
tem vasto percentual de firmas informais (percentual entre 40 a 50%), pouco
eficientes, pouco rentáveis, incapazes de pagar salários próximos ao salário
mínimo – não se deixe iludir pela imagem das grandes empresas, com alta
rentabilidade.
Sem o salário mínimo, muitos brasileiros teriam salários
baixíssimos. Uma triste verdade, mas compatível com um país de renda
média-baixa e estagnado. Muitos alunos se surpreendem quando mostro dados do
principal indicador de renda, a renda per capita. Dependendo da métrica, o
Brasil está abaixo da média mundial. Podemos cair para o patamar de país de
renda baixa. Não somos uma potência econômica; estamos muito longe disso. Temos
potencial para nos tornarmos uma potência econômica, entretanto, esse
cenário exige várias reformas estruturais, mudança na mentalidade e na cultura,
e nas instituições. Estamos dispostos a seguir esse caminho?
Não sei se a cidade de Mariana irá impor a lei que limita o
valor dos aluguéis. Se impor, as consequências acontecerão cedo ou tarde. A
cidade se tornará mais pobre ao longo do tempo, pois a construção de moradias é
uma forma de riqueza e investimento. A população, quando os efeitos deletérios
da medida chegarem, fará a conexão entre a lei e o resultado? Haverá
aprendizado? É uma pergunta relevante, pois o Brasil, na esfera econômica,
pouco aprende com os seus erros passados.
Perfeito. Estava pensando sobre isso também, mas especificamente sobre a questão de condomínios/casas construídas pelo governo.
ResponderExcluirLembro-me de que aconteceu algo parecido(no caso das leis) em Portugal, na capital, se não me falhe a memória. Tinha proprietários que preferiam deixar vago a não alugar.
A questão do aumento/diminuição da população também influencia nessa conta né? Por exemplo, uma cidade que está diminuindo a população e, portanto, a demanda está diminuindo, enquanto a oferta continuar estável, nesse caso os preços tendem a diminuir. Caso contrário, demanda aumentando - crescimento populacional - e oferta estável, por causa de algum desestímulo, ocorrerá o aumento dos preços.
Leis relacionadas a urbanização também afetam isso. Por exemplo, limitação para construção de prédios, condomínios e casas em determinadas áreas muito próximas às demandadas, como centros comerciais e corporativos, zonas industriais, isso poderia aumentar os preços também, levando a população para zonas afastadas, como residenciais construídos pelo governo, geralmente eles ficam muito afastados desses centros.
Agora é puro achismo meu, pode parar aqui se quiser rsrs: As vezes penso que o lobby feito pelo setor imobiliário (tem isso também) é muito de mão dada com políticos e agentes públicos. Lançar leis que impedem e/ou limitam o crescimento/expansão de novos empreendimentos em nesses locais muito demandados para que fiquem muito caro, empurram pessoas (tipo uma classe média) que não poderiam pagar mais para, digamos, alguns KM mais longe daquela zona, e esse pessoal que saem de lá faz o mesmo efeito que causaram a saída deles antes, mas agora com uma classe com menor poder que a deles. E assim sucessivamente. Agora vamos chegar aonde quero, que é os locais onde as casas e condomínios de programas do governo são construídas. Na minha cidade, a notei que a maioria é construída em locais muito afastados, aquele empurra empurra pode acabar nesses justamente nesses locais rsrs. Isso para mim é um jogo de ganha ganha de políticos com setor mobiliário.
Eu concordo que essas leis para segurarem preços geralmente dão super erradas, mas as leis e regulamentações relacionadas à urbanização também podem ter efeitos negativos. Se não me engano, em Londres tem muito disso, quanto a construção de prédios mais altos.
De todo modo, gostei do artigo, vai ao encontro da forma que eu penso também
Obrigado pelo feedback. Eu concordei com todas as suas colocações. Leis e regulamentações, quando restringem ou dificultam a construção de novas moradias, funcionam como restrições à oferta, portanto, os preços tendem a subir. O mesmo vale se a população se reduz: como a demanda cai, os preços tenderiam a cair.
ExcluirE há interações entre políticos e empresários influentes no setor imobiliário - infelizmente, uma realidade que abrange outros ramos da economia...
Na verdade, restringir a oferta não é uma tática usada somente pelo setor imobiliário. Organizações profissionais, como a OAB, a de medicina, entre outras carreiras, por vezes alegam a necessidade de restringir a abertura de novos cursos, alegando qualidade de ensino e dos novos profissionais. Mas há sempre o componente de segurar a oferta de novos profissionais para segurar o preço (no caso, o salário) elevado.