domingo, 7 de janeiro de 2024

Sobre Leis que Limitam os Aluguéis

Sucesso que geram no curto prazo não compensa o prejuízo que chegará no futuro

 

controle de preços

Hoje discutirei leis que limitam o reajuste de aluguéis. A ideia é não permitir que proprietários reajustem ou estabeleçam valores de aluguéis muito elevados. A motivação dessa medida, em geral, e o raciocínio, incorreto na maioria das vezes, é a de que os proprietários estão abusando dos inquilinos, explorando-os, cobrando aluguéis injustificáveis. Há um erro na causalidade ao impor leis deste tipo: o de que os altos aluguéis causam o alto custo de viver nas cidades. O que ocorre é o contrário: o alto custo da cidade joga os aluguéis para cima. 

Os primeiros meses de vigência dessas leis passa a ilusão de que a medida foi acertada, pois os preços de aluguéis irão cair – a inflação da cidade e, portanto, o custo de viver nela declinará. Dessa forma, podemos dizer que no curto prazo a lei que limita o preço de aluguéis funciona. O problema surge nos meses e anos subsequentes, quando o reajuste do aluguel, que passa a ser controlado pelo governo e políticos, não acompanha o desejo dos proprietários das residências. Ocorrerá desestímulo em investir e construir novos apartamentos e casas, pois o retorno do investimento na forma do recebimento de aluguéis foi reduzido. Em outras palavras, a oferta de apartamentos irá se reduzir. Mas e a demanda?

A demanda por moradias continuará crescendo na velocidade de antes da lei, portanto, em crescimento contínuo. Mas se há quantidade cada vez menor de apartamentos, teremos um descompasso entre oferta de moradias e a demanda por elas. Sem a lei que limita os reajustes, teríamos aumento no preço dos aluguéis. Todavia, como essa opção está descartada, teremos escassez e falta de moradias (e filas de espera). Consequências típicas de controle de preços.

Eu estou escrevendo sobre esse tema porque recentemente, aqui na cidade de Mariana-MG, cidade histórica, universitária, e alvo de atuação de mineradoras (Vale, Samarco) – com o adicional de empreiteiras refazendo moradias das vítimas dos desastres causados pela Vale -, o preço de aluguéis disparou para valores absurdos. Absurdos no sentido de considerar que Mariana é uma cidade de interior com mais ou menos 60 mil habitantes, pouco industrializada e com economia pouco moderna. Em suma, uma cidade do interior brasileiro. Por exemplo, há kitnets (minúsculas) no valor de 2 mil reais para alugar – e há quem pague o valor!

Aluguéis exorbitantes geraram o clamor da população. Políticos ouviram e criaram um projeto de lei que... limita e controla o nível dos aluguéis (enquanto escrevo, o projeto está em fase de aprovação). Quando fui informado desse projeto, em uma roda com marianenses, todos se mostraram contentes. Afirmaram que o problema dos aluguéis será resolvido. Eu pensei em objetar, mas tamanha a empolgação dos envolvidos, eu desisti.

Limitar os preços causa problemas não somente no mercado imobiliário, como também em outros mercados. O salário mínimo é outro exemplo de controle de preços. Escrevi anteriormente sobre ele, fazendo algumas críticas (aqui e aqui) – fui criticado por alguns leitores. Mas o ponto é que o salário mínimo é um preço, o preço da mão de obra, que é imposto pelo governo. Sem o governo, a oferta de trabalhadores e a demanda de contratação das firmas iria gerar o salário de equilíbrio. No caso brasileiro, seria mais baixo que o salário mínimo. Daí o problema do salário mínimo: gera descompasso entre a oferta e a demanda, culminando em desemprego, pois muitas firmas não conseguem (não têm capacidade financeira) pagar salários neste nível. O Brasil tem vasto percentual de firmas informais (percentual entre 40 a 50%), pouco eficientes, pouco rentáveis, incapazes de pagar salários próximos ao salário mínimo – não se deixe iludir pela imagem das grandes empresas, com alta rentabilidade.

Sem o salário mínimo, muitos brasileiros teriam salários baixíssimos. Uma triste verdade, mas compatível com um país de renda média-baixa e estagnado. Muitos alunos se surpreendem quando mostro dados do principal indicador de renda, a renda per capita. Dependendo da métrica, o Brasil está abaixo da média mundial. Podemos cair para o patamar de país de renda baixa. Não somos uma potência econômica; estamos muito longe disso. Temos potencial para nos tornarmos uma potência econômica, entretanto, esse cenário exige várias reformas estruturais, mudança na mentalidade e na cultura, e nas instituições. Estamos dispostos a seguir esse caminho?

Não sei se a cidade de Mariana irá impor a lei que limita o valor dos aluguéis. Se impor, as consequências acontecerão cedo ou tarde. A cidade se tornará mais pobre ao longo do tempo, pois a construção de moradias é uma forma de riqueza e investimento. A população, quando os efeitos deletérios da medida chegarem, fará a conexão entre a lei e o resultado? Haverá aprendizado? É uma pergunta relevante, pois o Brasil, na esfera econômica, pouco aprende com os seus erros passados. 


2 comentários:

  1. Perfeito. Estava pensando sobre isso também, mas especificamente sobre a questão de condomínios/casas construídas pelo governo.

    Lembro-me de que aconteceu algo parecido(no caso das leis) em Portugal, na capital, se não me falhe a memória. Tinha proprietários que preferiam deixar vago a não alugar.

    A questão do aumento/diminuição da população também influencia nessa conta né? Por exemplo, uma cidade que está diminuindo a população e, portanto, a demanda está diminuindo, enquanto a oferta continuar estável, nesse caso os preços tendem a diminuir. Caso contrário, demanda aumentando - crescimento populacional - e oferta estável, por causa de algum desestímulo, ocorrerá o aumento dos preços.

    Leis relacionadas a urbanização também afetam isso. Por exemplo, limitação para construção de prédios, condomínios e casas em determinadas áreas muito próximas às demandadas, como centros comerciais e corporativos, zonas industriais, isso poderia aumentar os preços também, levando a população para zonas afastadas, como residenciais construídos pelo governo, geralmente eles ficam muito afastados desses centros.

    Agora é puro achismo meu, pode parar aqui se quiser rsrs: As vezes penso que o lobby feito pelo setor imobiliário (tem isso também) é muito de mão dada com políticos e agentes públicos. Lançar leis que impedem e/ou limitam o crescimento/expansão de novos empreendimentos em nesses locais muito demandados para que fiquem muito caro, empurram pessoas (tipo uma classe média) que não poderiam pagar mais para, digamos, alguns KM mais longe daquela zona, e esse pessoal que saem de lá faz o mesmo efeito que causaram a saída deles antes, mas agora com uma classe com menor poder que a deles. E assim sucessivamente. Agora vamos chegar aonde quero, que é os locais onde as casas e condomínios de programas do governo são construídas. Na minha cidade, a notei que a maioria é construída em locais muito afastados, aquele empurra empurra pode acabar nesses justamente nesses locais rsrs. Isso para mim é um jogo de ganha ganha de políticos com setor mobiliário.
    Eu concordo que essas leis para segurarem preços geralmente dão super erradas, mas as leis e regulamentações relacionadas à urbanização também podem ter efeitos negativos. Se não me engano, em Londres tem muito disso, quanto a construção de prédios mais altos.

    De todo modo, gostei do artigo, vai ao encontro da forma que eu penso também

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    1. Obrigado pelo feedback. Eu concordei com todas as suas colocações. Leis e regulamentações, quando restringem ou dificultam a construção de novas moradias, funcionam como restrições à oferta, portanto, os preços tendem a subir. O mesmo vale se a população se reduz: como a demanda cai, os preços tenderiam a cair.
      E há interações entre políticos e empresários influentes no setor imobiliário - infelizmente, uma realidade que abrange outros ramos da economia...
      Na verdade, restringir a oferta não é uma tática usada somente pelo setor imobiliário. Organizações profissionais, como a OAB, a de medicina, entre outras carreiras, por vezes alegam a necessidade de restringir a abertura de novos cursos, alegando qualidade de ensino e dos novos profissionais. Mas há sempre o componente de segurar a oferta de novos profissionais para segurar o preço (no caso, o salário) elevado.

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