Medidas pontuais não resolvem problema brasileiro, mas ajudam a superá-lo
As projeções do mercado financeiro em relação ao patamar da taxa de juros subiram para 6,5% até o final desse ano, enquanto a taxa de inflação é esperada atingir valor próximo a 6%. Esses valores não deveriam surpreender aqueles que prestam atenção ao ambiente macroeconômico, bem como a deterioração que esse tem sofrido e sofreu desde a eclosão da Covid-19.
Sobre o patamar da taxa de juros, dada a ausência de reformas que possam conter o avanço do gasto público, o risco país não cedeu e continua a atrapalhar o financiamento da dívida pública. Credores simplesmente não investem em quaisquer devedores, e o Brasil não se apresenta como um devedor que fará a lição de casa.
Para entender o avanço da inflação, pode-se recorrer à escassez de produtos e insumos, como os semicondutores, aos auxílios emergenciais, ou a própria política monetária do banco central praticada até a pouco tempo. Como a chegada do vírus interrompeu a produção do país, enquanto a demanda permaneceu mais ou menos constante, os preços seriam pressionados, como de fato tem ocorrido. É indício de que a economia brasileira empobreceu nos últimos meses, embora algumas previsões apontem para rápida recuperação nos próximos semestres.
Esse crescimento que o produto presenciará não terá vida longa, muito pelo contrário. A expectativa é que tão logo as vacinações em massa ocorram, com o subsequente salto na produção, a trajetória do Brasil voltará para a sua marcha costumeira: lenta e fraca expansão do PIB. Como discuti em uma série de 10 artigos que apontaram políticas e reformas que poderiam melhorar o desempenho econômico do país, a explicação perpassa pelos problemas estruturais da economia, vislumbrados e consubstanciados pela baixa produtividade em relação às demais nações.
O noticiário mostrou que as reformas administrativa e tributária estão avançando, mas é difícil avaliar o alcance destas quando vários acordos (nos bastidores) estão ocorrendo para viabilizar o avanço destas. Quem leu o livro de Malu Gaspar, A Organização, entenderá que ambas as reformas podem ser desidratadas por afetarem interesses bem estabelecidos (de políticos, empresários, grupos, corporações).
No cenário otimista, no qual essas reformas ocorram e consigam melhorar a situação fiscal, as taxas de juros e de inflação sofreriam pressão para baixo. Pode-se incluir a taxa de câmbio nessa avaliação, a qual poderia reduzir a significativa desvalorização que sofreu nos últimos meses. Esse rearranjo dos preços ocorreria porque essas reformas melhorariam o funcionamento da máquina pública, com efeitos positivos sobre o ambiente macroeconômico.
Por outro lado, seria equivocado esperar crescimento acelerado após essas duas reformas. Em geral, é um argumento ruim (e errado) levantado pela oposição de que a ausência de rápido crescimento é indício de que a reforma não funcionou. Na economia, nem toda política e reforma apresentam efeitos imediatos. O tripé macroeconômico, inaugurado por Fernando Henrique Cardoso durante o seu mandato (1995-2002), surtiu efeito sobre o PIB apenas por volta dos anos 2004-2005. FHC plantou, e Lula colheu os resultados. Exceção de reforma com rápido efeito foi o Plano Real de 1994, quando a hiperinflação brasileira foi eliminada em um só golpe após a implantação da nova moeda, o real.
O cenário econômico do Brasil pode evoluir positivamente ou negativamente, dependendo do avanço das reformas. Países de relevância mundial, como os Estados Unidos e China, podem influenciar sobre o desempenho brasileiro na medida em que o que ocorre nos seus territórios resvala em solo tupiniquim. Não somos uma economia isolada. Mas precisamos fazer o dever de casa.
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