quinta-feira, 8 de julho de 2021

Resenha: O Anticristo (Friedrich Nietzsche)

Nietzsche analisa o cristianismo desde sua ascensão até difusão pela sociedade ocidental

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Essa é a quinta resenha de um livro de Friedrich Nietzsche. E tive facilidade em compreender a evolução da obra. Talvez seja o efeito da leitura dos livros anteriores, uma vez que as ideias do autor se interligam em seus vários livros. A apresentação da obra, escrita por Gabriel Rodrigues, me ajudou bastante, pois ela resume tudo que será lido e argumentado por Nietzsche. 

Como nas obras passadas, o autor ataca o cristianismo desde o início até a última página. Utiliza palavras e expressões pesadas para criticá-lo. Ao contrário das outras obras, nessa Nietzsche parece mais irritado com a religião cristã. Imagino que a leitura de sua biografia, contextualizando o momento da produção de Anticristo, possa fornecer dicas para toda a acidez em suas palavras. 

Sobre o livro, não há novidades em relação ao seu pensamento, exceto a concentração e foco no surgimento, evolução e difusão do cristianismo. Este surgiu como recurso dos indivíduos oprimidos, os quais criaram uma religião que louvasse a situação destes em oposição aos que dominavam. O Deus cristão reflete esse ideal, com passagens pouco amistosas para os ricos e poderosos. Seria a moral dos escravos em detrimento da moral dos nobres. 

Nietzsche afirma que o cristianismo é a religião dos decadentes, humanos desafortunados, sem perspectiva de melhorarem suas vidas, mas que encontraram nessa moral uma forma de reverter o cenário. E conseguiram. Com a difusão do cristianismo, os seus valores se tornaram traços indeléveis na construção das sociedades, como o princípio de que "todos são iguais perante a Deus". Tal princípio guiaria discussões políticas culminando no princípio de "direitos iguais para todos". Olavo de Carvalho também analisa e descreve essa relação no livro O Jardim das Aflições.  

Mas dentro do arcabouço teórico de Nietzsche, essa nova concepção de tratar os indivíduos é problemática para o desenvolvimento do homem. O filósofo é a favor da desigualdade de direitos, algo que com certeza soa anacrônico para os dias correntes. Entretanto, faz sentido dentro do mundo de Nietzsche. Com a desigualdade de direitos, forjada e mantida pela natureza, os indivíduos se distinguiriam por características inatas, seguindo a marcha da teoria evolucionista de Darwin. Lembrando que Nietzsche acreditava no super homem, aquele que conduziria a humanidade para novos horizontes. 

O cristianismo teria quebrado esse processo, defendendo a igualdade entre todos. Uma das ferramentas para isso foi colocar a compaixão como uma de suas principais virtudes. Levada até as últimas consequências, argumenta Nietzsche, a compaixão aumentaria o sofrimento na Terra, pois além dos nossos próprios infortúnios, sofreríamos pelos dos próximos. 

Outra questão muito alardeada é o ressentimento e vingança impotente que teria motivado os cristãos a erguerem a religião. Incapazes de revidar as ofensas que sofriam e a reverter a situação na qual se encontravam, resolveram alterar a moral, a consciência, minando o antigo sistema de valores. Neste ponto, socialistas e anarquistas também sofrem ataques, porque seriam correntes que buscariam gerar inveja no povo. Difundir o ressentimento. 

Há comparações do cristianismo com o budismo, análise do comportamento de Jesus e de Paulo, e como o cristianismo influencia a forma como interpretamos o mundo. Como os demais livros, essa obra ajuda a questionar vários pontos de vista que são tomados como dados.

A acidez nas críticas (uma raiva latente em cada linha) poderia ter sido amenizada, todavia, talvez tenha sido intencional do próprio autor. Eu particularmente não gosto muito quando uma obra visada para análise tem esse tipo de recurso. Mas é questão de preferência.

Por fim, por mais controverso que seja Anticristo, ele ajuda a conectar as outras obras e a clarear a forma como Nietzsche pensava. Continuo, porém, com o mesmo ceticismo: acho que o mundo de Nietzsche não seria factível. 

As resenhas dos outros livros seguem abaixo:

1) Aurora

2) Genealogia da Moral 

3) A Gaia Ciência

4) Além do Bem e do Mal




 

3 comentários:

  1. Nietzsche é um ateu sincero, ataco sem dó mesmo aquilo que odeia. Todavia, sua base teológica é fraca. Ataca um tipo de 'Cristianismo' que é da cabeça dele. Outros autores ateus da época empenharam de igual modo a atacar o Cristianismo. Por outro lado, ignorando as obras de apologia. Na verdade, se olhar bem, sua critica não é meramente quanto ao Cristianismo, mas também contra o judaísmo e o pensamento pós-socrático.

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    1. "Na verdade, se olhar bem, sua critica não é meramente quanto ao Cristianismo, mas também contra o judaísmo e o pensamento pós-socrático."
      Concordo com essa afirmação. Ele critica vários pensamentos posteriores aos gregos e romanos. O foco recaiu sobre o cristianismo, talvez, por ter se tornado o pensamento central do mundo ocidental, e por sua influência na Alemanha.

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  2. Na realidade,ele faz um ataque aquilo que o cristianismo veio pregar,,abnegação aos prazeres terrenos,e aceitar fatos negativos da vida,como castigo de Deus..

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