segunda-feira, 12 de julho de 2021

Resenha: Nudge: Como Tomar Melhores Decisões sobre Saúde, Dinheiro e Felicidade (Richard Thaler e Cass Sunstein)

Economia comportamental mostra que pode ir além de apenas apontar vieses, erigindo nova forma de atuação do governo

richard thaler cass sunstein


O livro Nudge tem semelhanças com o livro Rápido e Devagar, de Daniel Kahneman; ambos criticam a forma como nós humanos somos construídos nos modelos formais de Ciência Econômica. Essa crítica é sustentada com a utilização de vários experimentos que evidenciam como nosso comportamento pode ser alterado por pequenos detalhes (temos vários vieses). Esses dois livros compõem a Economia Comportamental, ramo que vem crescendo e ganhando notoriedade na Economia. Nudge vai além de Rápido e Devagar e defende a reformulação da atuação do governo de forma a incorporar resultados dessa linha de pesquisa. 

Nudge pode ser entendido como um pequeno empurrãozinho (ou cutucada) ao tomarmos decisões. Como somos influenciados por diferentes aspectos, o nudge poderia nos direcionar para as melhores escolhas possíveis. Os autores afirmam que "nudges estão em todos os lugares", bastando que prestemos atenção para percebê-los.  Já enviou um email que deveria ter um arquivo em anexo, e se esqueceu de anexá-lo, mas foi avisado pelo programa que não havia arquivo? Isso foi um nudge. Outro exemplo de nudge são os caixas eletrônicos que impedem o avanço de serviços caso o usuário não retire o cartão inserido. Nudge que impede que vários cartões sejam deixados para trás. 

Nesses exemplos, repare que a liberdade do indivíduo foi conservada. A alteração foi apenas na sinalização. Essa será uma preocupação constante durante a obra. Melhorar o resultado para as pessoas sem reduzir a margem de escolha destas. Nesse arcabouço, o termo paternalismo libertário é definido e defendido. Paternalismo porque há um arquiteto ao elaborar determinado esquema que indicará a melhor opção. Libertário porque o indivíduo conservará ampla margem de escolha. Não há coerção no paternalismo libertário. 

Entre os vários exemplos dados para sustentar a ideia (livro é rico em experimentos e descrições de acontecimentos), o governo sueco criou a previdência social na qual o poupador poderia seguir a opção padrão (fundo de investimento elaborado pelo próprio governo com ajuda de consultores) ou escolher ele próprio os fundos de investimento (havia mais de 300 fundos disponíveis). Um ponto chave é que o governo estimulou sua população a buscar fundos de investimento entre a miríade de opções. Faz sentido se acreditarmos que quanto maior o número de alternativas, melhor será o resultado para o consumidor. Mas não é esse o caso. 

Nesse ponto, 3 equívocos são discutidos. O primeiro é a falsa suposição de que sempre estaremos em melhor situação quanto maior o número de opções. O próprio livro Rápido e Devagar já derrubou essa hipótese, ou, colocando de forma mais suave, a questionou. O segundo ponto é que é impossível não influenciar pessoas em suas decisões. Sempre somos influenciados, às vezes por detalhes irrisórios (indivíduos tendem a investir mais em ações de empresas nas quais as siglas apresentam sentido gramatical, de novo, exemplo de Rápido e Devagar). Por fim, Thaler e Sunstein assinalam que paternalismo não envolve necessariamente coerção. 

Voltando ao exemplo sueco, os poupadores que escolheram a opção padrão tiveram melhor rendimento do dinheiro investido, ao passo que aqueles que seguiram o caminho entre os 300 fundos tiveram dificuldades de balancear risco-retorno-custo. Se indivíduos desejam poupar mais, com melhor rendimento, não faria sentido que o governo sueco tivesse, ao invés de incentivar a escolha entre várias opções, ter incentivado a escolha padrão? (Temos a tendência de seguir a escolha padrão, talvez por julgá-la elaborada por arquitetos de escolha altruístas. Nem sempre este é o caso).

Saindo da esfera de investimento, passando pela obesidade, casamentos, tráfego, vícios, entre outros. É argumentado que pequenas modificações na arquitetura de escolhas pode melhorar significativamente a vida das pessoas. 

Uma forma de entender por que temos dificuldades de fazer boas escolhas é que temos dois sistemas para lidar com nossas tarefas diárias: a forma lenta de pensar (sistema reflexivo) e a forma rápida (sistema automático). Ocorre que deixamos o sistema automático dominar as ações, sendo que mesmo quando nos esforçamos para pensar um pouco mais, a complexidade de vários domínios da vida dificulta escolhas acertadas. Daí a virtude do nudge

Também sofremos vários vieses cognitivos. Sabe a probabilidade de um atentado terrorista? Mesmo sendo baixíssima, muitos temem mais por esse ataque do que acidentes mais frequentes, como de automóveis. Somos avessos a perdas, dando menor peso aos ganhos. Traçamos causalidades onde estas não existem. Construímos estórias para interpretar eventos, e elas interferem em nossas decisões. A lista é grande. Aliado a esses vieses, temos características que nos prejudicam, como a inércia, a procrastinação e a imitação.  Todos esses elementos são discutidos de forma objetiva e por vezes cômica durante o livro. 

Evidenciados os pontos que realçam nossa dificuldade em tomar decisões importantes, os autores conectam essas pequenas falhas com os inúmeros nudges. Se aproximando do final, dedicam um capítulo apresentando possíveis críticas. Todas são respondidas e esclarecidas com precisão. Gostei especialmente desse capítulo, pois não escondeu as brechas da teoria, se esforçando em minimizá-las. 

Quem já leu Rápido e Devagar perceberá muitas semelhanças, especialmente na parte dos vieses. Entretanto, Nudge foi além ao defender uma nova forma de atuação do governo, conservando a liberdade individual e fornecendo melhorias para os indivíduos. Sabendo que o mercado entrega vários resultados positivos, mas que algumas vezes pode falhar nessa tarefa - algumas falhas por causa de nossos vieses -, a ação pública poderia corrigir pequenos detalhes, sem prejudicar o campo de escolha dos indivíduos. Particularmente, na minha opinião o paternalismo libertário é atrativo, funcional e merece ser discutido, pois tem enorme potencial para corrigir falhas de mercado sem reduzir o seu dinamismo.






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