Utilização de estatais com fins eleitoreiros e de curto prazo é argumento para alterar a forma como são tratadas por políticos
A confusão na troca da presidência da Petrobras evidencia como pode ser perniciosa a interferência política sobre empresas. Não é surpresa que Bolsonaro busca alterar a condução da estatal. Ele deseja alinhar os objetivos da empresa aos seus, ou seja, gostaria que a Petrobras reduzisse a transferência da alta dos preços internacionais do petróleo ao consumidor brasileiro. Em ano eleitoral, inflação crescente é algo indesejável, ainda mais quando esse item é tão usado e difundido no país, como é a gasolina.
A princípio, não há nada de errado na substituição dos atuais diretores e administradores de empresas públicas por outros. É normal que ocorram trocas, dadas as diferentes visões de como gerenciar a economia. Entretanto, o problema é a motivação de tal ato. No Brasil, como é conhecido, empresas estatais são usadas como moeda de troca na política: o aglomerado de partidos desprovidos de identidade, cunhado de "centrão", aceita apoiar o governo desde que este conceda cargos em ministérios e em estatais. É uma disfuncionalidade do nosso sistema político. Repito: nada de errado a rigor. A questão é a forma como é usado um dispositivo legítimo para permitir a governabilidade.
Com base no reconhecimento desse ponto, justifiquei em outro texto o porquê de eu me posicionar favorável à privatização das estatais. Além dos argumentos de eficiência e economia de recursos públicos, seria uma forma de eliminar essa forma de "favores políticos" sem quaisquer contrapartidas benéficas para a população. Muito pelo contrário. Basta comparar o cenário brasileiro antes e após a privatização das empresas estatais de telefonia. Anteriormente à privatização delas, telefone fixo era um artigo de luxo na vida do brasileiro (sua posse era disputada inclusive em heranças, pergunte aos seus pais, avós, ou pessoas mais velhas).
Então qual o problema de Bolsonaro intervir na presidência da Petrobras? É que o principal fator impulsionando essa medida é uma visão de curto prazo: o ganho eleitoral - na verdade, nos bastidores, há indícios de que a troca também seja motivada por busca de apoio do "centrão".
De vez em quando um leitor me questiona: qual a solução? No melhor dos mundos, teríamos várias empresas fornecendo petróleo, sendo a totalidade delas, ou a maior parte, privadas. Portanto, não faria sentido pressionar uma única empresa para baixar os preços. Esse é o cenário com abertura comercial e maior competição entre as empresas. A pressão sobre a Petrobras deixaria de existir, dado que teríamos outras tantas empresas atuando no setor. Todavia, não é esse o caso.
Outra solução seria permitir que a empresa criasse um fundo de estabilização do preço do petróleo. Talvez com parte de seus lucros. Esse fundo seria aplicado em ativos financeiros, o que daria rentabilidade ao capital investido. Em momentos de alta dos preços (como atualmente), a Petrobras poderia sacar parte desses recursos para subsidiar o preço da gasolina. Mas a criação desse fundo teria te ser pensada anos antes da alta dos preços. Mais um motivo para associar a atual troca de comando da Petrobras com política eleitoreira. Se o governante tem o objetivo expresso de proteger a população da alta de preços, por que não criou medidas nesse sentido quando assumiu o governo?
O economista Fernando de Holanda Barbosa argumenta que caso a privatização seja descartada, por questões ideológicas e preconceituosas, uma alternativa seria criar legislação proibindo que pessoas incapacitadas assumissem o posto de diretores das estatais. Acho difícil tal caminho. Lembro de Roberto Campos dizendo que no Brasil algumas leis "pegam" e outras não. A dificuldade de privatizar gigantes estatais mostra que esse caminho não é muito bem recebido por políticos. Por que apoiariam uma lei que retira a moeda política da mesa? Um exemplo histórico: o Banco Central foi criado em 1964 com a finalidade de ser uma instituição independente. Somente em 2021 ele recebeu formalmente essa independência. Mais de 50 anos para a lei "pegar". Não vejo com muito otimismo legislação regulando diretores em estatais. Mas quem sabe eu esteja errado. Por enquanto, episódios de pura confusão na troca de diretores continuarão ocorrendo.
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