quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Discriminação de preços e extração de lucro


Produtores do Playstation 4 e do Iphone 11 responsabilizam a tributação brasileira pelo alto custo de venda, mas omitem uma parte relevante da história.


                                    Foto de Jeso Carneiro
Foi anunciado recentemente os preços da nova geração do Iphone no Brasil, produto que é sucesso de vendas da Apple. O modelo Iphone 11 com 256 gigabytes (GB) de memória será vendido por 5.799 reais, o Iphone 11 Pro 512 GB por 8.999 reais e o Iphone 11 Pro Max 512 GB por nada menos que 9.599 reais. No próximo ano será a vez da Sony colocar no mercado um de seus principais produtos, o Playstation 5, e não causará surpresa se o seu preço ultrapassar a marca de 5 mil reais.
Em 2013, quando o Playstation 4 chegou no Brasil, o seu preço foi de 4 mil reais, causando amplas críticas pelos consumidores. A justificativa do gerente-geral da Sony da América Latina, Mark Stanley, foi a de que a tributação brasileira é excessivamente pesada, acarretando no encarecimento do produto.
Caso similar e recorrente ocorre no comércio de automóveis. É consenso entre os brasileiros que os carros novos vendidos no país são muito caros em comparação aos carros vendidos no exterior. Chega-se ao ponto do carro ser produzido no Brasil, e depois vendido em outra nação, por exemplo o México, e o seu preço ser inferior ao praticado no Brasil. As concessionárias quando deparadas com críticas por tais preços culpam – adivinhem – o governo.
É verdade que o Estado tem parcela de culpa, consubstanciada no termo custo Brasil. O custo Brasil engloba uma infraestrutura precária para o transporte de cargas, a tributação distorcida que onera os produtores, legislação que protege o produto nacional e prejudica a entrada de mercadorias estrangeiras mais eficientes, energia elétrica cara, entre outros tantos vilões que fazem com que o custo de vários produtos e serviços seja mais elevado aqui do que nos demais países.
Mas se por um lado as concessionárias e a Sony apontam corretamente o custo Brasil como fator de encarecimento dos produtos, esquecem – ou omitem – o restante da história. Empresas com produto diferenciado conseguem acrescentar valor no preço do produto, isto é, elas aumentam a margem do lucro. É um comportamento típico de monopolistas.
Pense no caso da Sony ao vender o Playstation 4. Se os consumidores estão propensos a pagar 4 mil reais, ainda que reclamando, por que a empresa iria cobrar menos que 4 mil? A Sony procurando aumentar suas receitas age corretamente ao elevar o preço do produto para que os consumidores mais propensos e ansiosos comprem pagando o valor mais alto. Conforme essa demanda seja atendida, ela reduz o preço gradualmente para captar a demanda dos consumidores ansiosos em obter o produto, mas que não conseguem ou não querem pagar 4 mil reais, e assim a empresa vai ajustando gradualmente o preço do Playstation ao longo do tempo e extraindo o máximo de renda dos consumidores. Consequentemente, a empresa consegue obter um grande lucro. Essa prática é chamada de discriminação de preços.
Agora vem outra questão: se as empresas agem dessa forma, por que não dizem publicamente? Ora, imagine o diretor da Sony em uma comitiva para divulgar o novo videogame afirmando que “a empresa cobrará 4 mil reais para extrair a renda dos consumidores mais ansiosos, e que somente após abastecer essa demanda, a empresa irá reduzir um pouco o preço, pois dessa forma estará maximizando o seu lucro comercial”. Não soaria muito bem, embora estivesse equipada com a verdade.
É mais fácil e vantajoso culpar o governo pelo preço mais alto. Ao transferir a culpa para o Estado, a empresa se livra da necessidade de explicar o porquê de um preço tão elevado, e reduz o risco de receber críticas por uma suposta política que priorize a obtenção de lucros elevados. No final, o consumidor fica satisfeito, este não foi explorado pela empresa, e sim pelo Estado, e a empresa transfere a culpa para o governo, e pode prosseguir com a discriminação de preço. Raciocínio similar pode ser realizado no mercado de automóveis brasileiro. Se o brasileiro aceita pagar um preço elevado, por que a empresa cobraria menos?

2 comentários:

  1. Há outro elemento na história; setores com proteção governamental. Há alta tributação á importados - veículos por exemplo - reduzindo a concorrência, curiosamente os "amigos do rei" - locadoras de veículo - compram com isenção fiscal e hoje em seus balanços observamos maior receita proveniente da VENDA de automóveis ao invés da Locação... Falam que no Brasil não tem inovação, mas a gente inova o tempo todo ao criar ineficiências no mercado rs

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    1. "Falam que no Brasil não tem inovação, mas a gente inova o tempo todo ao criar ineficiências no mercado" hhahahah Muito bom

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