sexta-feira, 11 de junho de 2021

Corrigindo a economia brasileira (parte 5)

Setor público precisa melhorar qualidade da prestação de serviços e destino do gasto fiscal

reforma administrativa


O quinto texto da série de artigos que propõe reformas que consigam recolocar a economia brasileira na trilha de crescimento com redução da desigualdade se concentrará na reforma do setor público (elevar a sua eficiência). Essa proposta engloba alterações em várias legislações, bem como a adoção de novas práticas.

A primeira modificação é a realização de uma reforma administrativa. Ela deveria impor melhores métodos de avaliação nos servidores públicos, limitar remunerações de todas carreiras (inclusive aproximando salários de profissões semelhantes do setor privado), agilizar exonerações e dispensas de servidores que não conseguissem cumprir o trabalho exigido e conciliar incentivos para melhor prestação de serviços (por exemplo, em algumas carreiras, impor salários flexíveis que aumentassem conforme o servidor prestasse maior quantidade de serviço). Nesse último caso, o exemplo dos professores universitários é evidente. Como atualmente estes recebem salários integrais independentemente da quantidade e qualidade do serviço prestado, há claro incentivo para uma baixa dedicação. Professores com várias publicações em revistas conceituadas, prestação de serviços técnicos para a comunidade (extensão), entre outras atividades, recebem o mesmo salário de professores que não fazem nada dessas atividades. 

Essa reforma também deveria eliminar privilégios, como aposentadorias especiais e férias de 60 dias de juízes. O teto de salários públicos deveria ser respeitado, sem artifícios que possibilitassem remunerações que o furasse, como novamente é o caso dos juízes, com os famosos penduricalhos (auxílio moradia, entre outros benefícios que não são contabilizados na regra do teto). Por fim, a forma como os aumentos salariais de servidores públicos são concedidos deveria ser melhor formulada, talvez criando uma regra de reajustamento, que impossibilitasse aumentos salariais acima do nível da inflação e que congelasse os salários em momentos de crise, como é o caso da atual pandemia. 

O segundo ponto com ampla margem de melhora é a prestação de serviços. Nesse quesito, os ganhos de produtividade são enormes, os quais seriam conjugados com a economia de recursos públicos, leia-se, os impostos que pagamos. Os exemplos abundam: estradas e rodovias com diversos buracos, filas para o atendimento no SUS, escolas que não conseguem competir com as suas contrapartes privadas, segurança e infraestrutura precária. Parte da solução repousa na realização de melhores contratos de concessão com o setor privado. Muitas rodovias concedidas pelo governo brasileiro se concentraram em apenas impor baixo preço no pedágio sobre motoristas, relegando a papel secundário a qualidade prestada do serviço. O ideal seria incluir crescentes investimentos sobre o serviço prestado. No ano passado tivemos um exemplo dessa preocupação, o acordo de prestação de saneamento básico de forma a universalizá-lo no território brasileiro

Em relação ao ensino, práticas bem sucedidas em outros países - igualmente recomendadas por trabalhos acadêmicos - poderiam ser seguidas, como a redução do número de alunos por sala de aula, ao invés de focar em apenas elevar a remuneração dos professores. No tocante às universidades públicas, mensalidades poderiam ser cobradas para alunos vindos de classe de renda média-alta. Ao não exigir mensalidades, essas universidades contribuem para a desigualdade de renda, dado que oferecem ensino tanto para pobres quanto para ricos, sendo que estes últimos frequentam melhores escolas ao longo da vida e, portanto, têm maiores chances de ingressar nessas universidades. A receita obtida pelas mensalidades poderia ser convertida para o próprio benefício da universidade, ajudando-a a se manter e a renovar o seu equipamento. 

Os demais tipos de serviços envolvem reformulação das leis que os regem, como é o caso da saúde. Da forma como está inscrito na Constituição de 1988, este setor envolve crescente judicialização. Dependendo da interpretação, o governo é obrigado a custear tratamento extremamente caro, desviando recursos que poderiam cobrir milhares de brasileiros em municípios pobres. Além disso, por causa do comportamento perdulário do governo com outras despesas, sobra-se parcos recursos para serem investidos na saúde. Conforme a população envelheça, esse problema se tornará mais agudo, como é o caso da previdência. 

Fazendo uma ponte com a observação anterior, é imperioso que o governo flexibilize os seus gastos primários. Atualmente, quase 95% de todo o gasto primário é rígido, estabelecido por lei. Há baixo espaço para realocações do gasto público. A maior parte deste gasto é canalizada para o pagamento de benefícios previdenciários e remunerações de servidores. Para fechar a conta, equilibrar as contas públicas, o governo se vê obrigado a cortar gastos discricionários, com destaque para gastos destinados à saúde e à infraestrutura. Esse processo é alvo de desinformação: segundo alguns, o governo (às vezes a culpa é colocada no "capitalismo") é considerado injusto e diabólico por cortar gastos sociais. É um equívoco. O que ocorre é que temos baixíssimo espaço para realizar gastos sociais. Precisamos reformular leis que regem outros gastos (novamente, a previdência e a reforma administrativa) para que o gasto anteriormente destinado a essas áreas seja realocado para áreas com maior retorno social. 

A última recomendação é a realização de estudos analisando o custo e benefício de programas e políticas públicas. Poderíamos seguir a Austrália, a qual criou uma comissão que investiga a produtividade de políticas. A vantagem dessa comissão é a de que ela forneceria argumentos técnicos, impessoais, para justificar oposição a determinadas políticas. Caso tivéssemos esse tipo de instituição, programas como Zona Franca de Manaus, política de conteúdo nacional e crédito subsidiado do BNDES para grandes empresas talvez não mais existiriam (sendo otimista, talvez tais programas nem sequer saíssem do papel), pois tem custo-benefício (extremamente) adverso. Temos o problema de programas fiscais temporários que se tornam permanentes. Essa comissão, ao investigar o retorno de tais programas, poderia ajudar a reduzir essa incidência. 

A análise de custo-benefício é importante porque programas públicos são financiados com impostos, recursos que são extraídos do setor privado, de todos nós. Portanto, o dinheiro público deve ser bem aplicado, deve gerar retorno social superior ao seu custo, caso contrário, como contribuintes, estaríamos presenciando péssimo investimento e inadequado uso de recursos públicos. 

Outras medidas paralelas poderiam ser pensadas, como o aumento da transparência do setor público, privatizações de estatais deficitárias, leis visando reduzir a corrupção, regras fiscais (estabelecer nível de endividamento) e melhora de canais de denúncia de irregularidades. Acredito que as 4 propostas descritas: reforma administrativa, melhor prestação de serviços, flexibilidade do gasto primário e comissão de produtividade possuem potencial para elevar a produtividade do setor público e reduzir gastos desnecessários. 

Contrastando essas propostas com o objetivo de elevar o crescimento brasileiro, o setor público seria mais produtivo, o que auxiliaria no aumento do PIB. A economia de recursos poderia ser usada para reduzir a dívida pública e, supondo maior flexibilidade dos gastos, alocações de recursos para projetos com maior retorno social. Nesse último caso, teríamos maiores fundos para educação, saúde, infraestrutura e segurança. A desigualdade de renda seria impactada de forma a reduzir esse indicador, uma vez que o público alvo dessa realocação de recursos seria os brasileiros vulneráveis e dependentes de serviços públicos.  

Até aqui, a série de reformas recomendadas foram:

1) ajuste fiscal

2) abertura comercial

3) reforma tributária

4) reforma trabalhista (flexibilizar o mercado de trabalho)

5) reforma do setor público


Na próxima semana escrevei o sexto texto da série.







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