quarta-feira, 19 de maio de 2021

Corrigindo a economia brasileira (parte 2)

Abertura comercial tem potencial de reverter o baixo crescimento brasileiro das últimas décadas

comércio internacional


Prosseguindo na série de textos propondo políticas e reformas econômicas para ajustar a economia brasileira, este se concentrará na abertura comercial. Na semana anterior, escrevi sobre a necessidade de arrumar as contas públicas, gerando um governo que produza superávits primários. O objetivo dessa série é mostrar que temos como alterar a condução da economia, possibilitando atingir a almejada tríade: elevado crescimento econômico, baixo nível de desemprego e redução da desigualdade de renda. 

Estamos entre as economias mais fechadas ao comércio internacional. Veja o gráfico abaixo com dados do Banco Mundial, retratando a soma das exportações e importações em proporção com o PIB da economia mundial. Desde 1960, a tendência tem sido para a abertura das fronteiras nacionais às mercadorias de variados países. Esse processo é conhecido como globalização comercial; as economias optaram em fazer parte das cadeias internacionais de produção (supply chains em inglês), se especializando nos ramos em que eram mais competitivas - desdobramento da divisão de trabalho, descrita por Adam Smith no século XVIII. O Brasil, por outro lado, insistiu no ultrapassado e falho modelo de substituição de importações, protegendo sua indústria da competição externa. Atualmente, nossa proporção de comércio internacional não ultrapassa a marca de 30% do PIB. 

banco mundial


Das vantagens de uma economia aberta ao comércio internacional, citarei as principais. Pela ótica do consumidor, este teria maior diversidade de mercadorias, além de preços mais baixos. Não é por mero acaso que os automóveis são mais caros no Brasil do que em outras localidades. Videogames novos, como o Playstation 5, chegam a custar 5 mil reais. Em uma economia aberta, não teríamos esse tipo de problema. 

Do ponto de vista do produtor, este teria maior trabalho em manter sua empresa ativa, pois a concorrência externa seria maior. O produtor nacional teria de buscar ganhos de produtividade para que conseguisse se manter no mercado. Algumas empresas fechariam, pois não conseguiriam fornecer serviço atrativo para os consumidores. Outras empresas se manteriam, dado que lograriam ofertar mercadorias boas a preços aceitáveis. Observe que aqui os consumidores se beneficiam, uma vez que terão melhores mercadorias a menores preços, como afirmei anteriormente. Um dos problemas de nossa economia é o fato de empresas pouco produtivas não saírem do mercado. A abertura ajudaria a reverter essa questão.

Para a economia como um todo, a saída de empresas pouco produtivas e o aperfeiçoamento das já estabelecidas aumentaria a produtividade total da economia. Esse aumento seria convertido em maior crescimento econômico e maior criação de vagas de trabalho. Em resumo, a economia seria mais dinâmica. Da tríade, dois objetivos seriam atingidos.

Sobre a desigualdade de renda, o resultado não é tão óbvio, dado que trabalhadores perderiam o emprego no caso de empresas que encerrassem suas atividades. Nesse ponto, o governo poderia intervir auxiliando esses desempregados. Seguindo as recomendações do livro de Banerjee e Duflo, Boa Economia em Tempos Difíceis,  a melhor política pública consistiria em fornecer treinamento para essas pessoas, não permitindo que o capital humano individual deteriorasse. Esse treinamento técnico facilitaria a reinserção desse grupo. Transferência direta de renda, como o seguro desemprego, também poderia ser utilizada para amenizar o choque negativo sobre a vida dessas pessoas. 

Importante destacar que juntamente com o fato de termos uma economia fechada, o governo brasileiro fornece subsídios e créditos facilitados para a indústria nacional (lembre do BNDES e sua relação com a JBS, Odebrecht...). A reversão dessa proteção culminaria em fundos públicos disponíveis que poderiam ser melhor utilizados para amortecer o lado dos "perdedores" com a abertura comercial. Essa economia de recursos poderia ser aplicada em programas que reduzissem a desigualdade de renda, como o Bolsa Família - e aqui a tríade é finalmente atendida. Ademais, dinheiro público subsidiado custeando grandes empresas (JBS, Odebrecht) não parece ser uma política coerente em um país com elevadíssima desigualdade de renda.

O modelo de substituição de importações (MSI) protege a indústria nacional sob o argumento de que a competição externa devoraria empregos. As evidências mostram resultado diferente. A verdade é que nossa indústria tem baixa produtividade, a qual seria obrigada a se modernizar para sobreviver à maior concorrência. Esse setor se defende com frases de cunho nacionalista e protecionista, e muitos brasileiros acreditam nessa falácia. No livro de Marcos Mendes, Por que o Brasil Cresce Pouco?, o autor dedica algumas linhas tentando explicar o porquê de os maiores beneficiários com uma possível abertura comercial (consumidores) se posicionarem contra ela. É uma narrativa que prejudica a modernização da economia brasileira. 

Com esse texto, temos duas políticas que melhorariam o gerenciamento da economia brasileira: ajuste fiscal e abertura comercial. Para termos uma ideia das modificações que a abertura causaria, basta visualizar o setor de streaming, parte pouco regulada por políticos, e que por isso tem crescido constantemente ao longo do tempo, com novas empresas (Apple TV+, Disney+, Netflix, Amazon prime, Paramount+, HBO go...) ofertando serviços a preços acessíveis. Imagine se o setor de streaming usasse do argumento da proteção da indústria nacional para evitar a concorrência: teríamos a Globoplay como representante do país, e as demais empresas enfrentariam altíssimos impostos e restrições para atuarem no mercado doméstico. Indo um pouco além, imagine se o argumento da indústria nacional obrigasse que assistíssemos apenas séries, novelas e filmes nacionais. A perda de bem estar (e de cultura) em virtude dessa política seria altíssima. É sobre isso que tentei explicar nesse texto: o prejuízo que temos em proteger as mercadorias nacionais, dando pouco espaço para os produtos internacionais. 


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