quarta-feira, 12 de maio de 2021

Corrigindo a economia brasileira (parte 1)

Dificuldade de equilibrar as contas públicas persegue o governo brasileiro há décadas

brasil contas públicas


Na coluna de Samuel Pessoa, Conversa com um leitor, foi explicitado a dificuldade de descrever uma solução para a tríade: elevar crescimento econômico, reduzir a desigualdade de renda e colocar o mercado de trabalho em pleno emprego. Imagino que Samuel não aprofundou nesse tópico devido ao escasso espaço que dispõe. Pretendo escrever uma série de artigos indicando alterações em políticas e regulamentos da economia brasileira que possam gerar o resultado almejado pelo leitor de Samuel. 

Esse texto se concentrará no gasto público. Atualmente o Brasil passa por severa crise fiscal em decorrência do comportamento perdulário do governo em todas as esferas. Veja que essa crise nos persegue mesmo antes da eclosão da Covid-19. O vírus piorou o cenário econômico combalido e pouco estável. 

O Estado brasileiro gasta mais do que arrecada, de forma sistemática, gerando uma poupança pública negativa. Como o investimento total de qualquer economia depende da poupança total, e esta é composta pela poupança do governo, do setor privado e do setor externo, a baixa poupança pública contribui para explicar o baixo nível de investimento. Como escrevi a um tempo, maior nível de investimento é relacionado com maior crescimento econômico

O financiamento do investimento, devido a ausência de recursos públicos, utiliza de fontes externas, capital internacional. Daí temos uma relação perigosa no longo prazo: déficit público se relaciona com déficit das contas externas, déficit corrente do balanço de pagamentos. Esse déficit se financia com o endividamento externo, gerando passivo externo, culminando no pagamento de juros para os demais países. Perde-se parte da reserva internacional com essa dinâmica. Dessa forma, ela é insustentável em prazos ampliados, exceto se o endividamento externo é convertido em aumento da produção. 

A explicação realizada até aqui ajuda a entender o baixo crescimento do PIB brasileiro. E a desigualdade de renda? Um Estado que sofre para acumular recursos apresenta baixa capacidade de realizar gastos sociais. Em outras palavras, o excesso de gasto público é acompanhado pelo aumento da dívida pública. Essa dívida deve ser paga, desviando recursos para amortizá-la. Como ocorre atualmente, cortam-se gastos que poderiam gerar ganhos disseminados, como os gastos em saúde e educação, para honrar os compromissos externos. Consequentemente, o espaço para políticas que poderiam combater a desigualdade de renda se torna menor. 

Poder-se-ia questionar o porquê de um governo tão endividado não cortar gastos desnecessários, ou gastos que geram baixo retorno social. A resposta é que a maior parte do gasto público brasileiro (mais de 90%) é rígida, isto é, regulações e leis estabelecem a forma como, uma vez arrecadado os impostos, estes serão gastos. Há baixa margem para realocar o dinheiro público.

A rigidez dos gastos mostra que o problema do excesso de gasto público pode ser entendido, em parte, por regulamentações pouco conducentes para propiciar maior eficiência na forma como o gasto ocorre. Podemos adicionar o rent-seeking promovido por grupos de interesse, os quais conseguem dobrar a legislação para os seus próprios benefícios. 

Outra consequência do excesso de gasto público é que ele retira espaço que poderia ser ocupado pelo setor privado. Na Ciência Econômica, esse processo é conhecido por crowding out. O desequilíbrio fiscal faz com que a taxa de juros incidente sobre emissão de dívidas para financiar o gasto público se eleve, impactando de forma desfavorável a realização de investimentos pelo setor privado: o crédito encarece - canal adicional que explica a queda de participação do setor privado é o desequilíbrio macroeconômico que o excesso de gasto acarreta (situação atual do Brasil). Como o mercado de trabalho é composto, em sua maioria, por empregos criados pelo setor privado, temos a desaceleração no surgimento de novos postos de trabalho. Além disso, mesmo que o governo tente estimular o mercado de trabalho com empregos públicos, estes tendem a apresentar baixa mobilidade, pois os funcionários possuem estabilidade. Portanto, temos que o excesso de gasto público prejudica o mercado de trabalho.

Dito isso, o comportamento ótimo do governo seria equilibrar as contas públicas, de preferência gerando superávits primários (poupança pública positiva), os quais reduziriam o patamar da dívida pública e o nível da taxa de juros. O governo teria recursos para realizar políticas sustentáveis que reduzissem a desigualdade de renda, como o Bolsa Família em escala ampliada, sem comprometer o equilíbrio econômico. Por fim, o setor privado, enfrentando juros menores e ambiente mais estável, expandiria os investimentos, dinamizando o mercado de trabalho.

No artigo da próxima semana escreverei sobre o segundo ponto que poderia melhorar o crescimento, a desigualdade e o mercado de trabalho brasileiro. 










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