quinta-feira, 1 de abril de 2021

Navio encalhado não é argumento contra a globalização

Cadeias de valor propiciaram enormes ganhos de produtividade, barateando mercadorias e elevando o padrão de vida das pessoas

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Bastou o encalhamento de um navio no Canal de Suez, inviabilizando o tráfego de vários outros navios, para que críticas direcionadas contra a globalização surgissem. Foi igualmente estranho que os argumentos não tenham sido contra pontos técnicos da globalização (eficiência, concorrência, alocações), mas sobre apenas esse incidente. 

A revista The Economist disse que o recuo da globalização nos levaria para um ambiente menos competitivo, no qual cada país protegeria suas empresas nacionais, impondo quotas de importação, elevados tributos aduaneiros e fornecendo subsídios. O resultado seria perda de eficiência na economia, e a queda de poder de compra para os consumidores, tendo que aceitarem produtos inferiores a preços mais elevados - ponto final de uma economia fechada na qual os produtores enfrentam baixa concorrência para vender suas mercadorias.

O responsável da reportagem talvez não tenha percebido, mas ele descreveu quase que de forma totalmente precisa o ambiente econômico da América Latina. As características elencadas acima formam o modelo de substituição de importação (MSI), visado a proteger os produtores nacionais da concorrência externa, fornecendo crédito barato e direcionado para empresários conectados politicamente. Tal modelo apresenta forte intervenção estatal sobre os preços, procurando melhorar alocações no mercado, sendo que na verdade pioram ainda mais o cenário. 

Um possível recuo da globalização comercial, com o  desaparecimento das cadeias de valor, significaria aproximação para o fracassado e obsoleto MSI, maior responsável pelo atraso econômico das economias latinas, com a honrosa exceção sendo o Chile, herege que decidiu seguir caminho contrário e que, por isso mesmo, se aproxima dos países de alta renda. 

Essas cadeias de valor nada mais são do que centros produtores que se especializaram em pequenas etapas produtivas. Produzem insumos que são usados por outras empresas em fases posteriores da produção. Cria-se enorme interdependência, possibilitando ganhos de produtividade na medida em que cada eixo se especializa no que faz de mais produtivo. É a divisão do trabalho em proporções internacionais. 

O Brasil seguiu caminho oposto, ao invés de nos inserirmos nessas cadeias, fechamos nossa economia para proteger indústrias nacionais ineficientes. O esforço reformista que existe hoje é justamente para nos afastarmos desse modelo ultrapassado e se aproximar das cadeias de valor. Quem critica a globalização com base em um navio encalhado desconhece as consequências do MSI.





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