Autores destrincham problemas estruturais e conjunturais para o retorno do crescimento
Organizado por Regis Bonelli e Fernando Veloso, A crise de crescimento do Brasil é uma coleção de artigos de pesquisadores (a maioria da FGV/IBRE) discutindo os principais tópicos que travam o crescimento do Brasil. O escopo do livro abrange tanto o período recente quanto o longo prazo - este último na discussão da produtividade da economia.
Os pontos discutidos ao longo dos capítulos são os elencados abaixo:
1) Crescimento econômico e produtividade;
2) Demografia;
3) Poupança e taxa de juros;
4) Investimento público;
5) Indústria nacional;
6) Infraestrutura;
7) Comércio internacional;
Como é enfatizado no livro, esses tópicos são esgotam a discussão dos empecilhos do crescimento brasileiro, mas tocam em pontos fundamentais para situar o problema e propor medidas para melhorá-lo. De uma forma geral, o livro pode ser resumido na frase de Regis Bonelli, a qual nos diz que "a crise do crescimento brasileiro é uma crise de produtividade". Os 7 fatores anteriores fornecem subsídios para entender o porquê da queda da produtividade, bem como a dificuldade de elevá-la.
O início da obra mostra um debate sobre a Nova Matriz Econômica (NME), alteração na condução da política econômica desde 2009, adotando maior participação direta do governo através de gastos, investimentos e subsídios para determinados setores industriais, a qual representou o afastamento do tripé macroeconômico (superávit primário, câmbio flutuante e regime de metas de inflação) implementado em 1999. A conclusão é a de que fatores externos e internos concorreram para a eclosão da crise de crescimento de 2015 - e que nos cerca no presente. O primeiro capítulo denotará maior responsabilidade sobre a NME, enquanto o segundo artigo balanceará a culpa com fatores externos (queda dos preços da commodities, por exemplo).
A tendência de aumento da participação de idosos e redução da parcela da população em idade ativa, ou seja, fim do bônus demográfico, é relacionado com o seu impacto sobre o crescimento potencial - o crescimento que não eleva os preços. Argumenta-se que, para atingir maior crescimento nos próximos anos, o Brasil terá de pensar em uma política de incentivo à imigração, algo inexistente atualmente.
Os pontos 3 a 6 são inerentemente relacionados entre si. O Brasil possui uma baixa taxa de poupança, tanto em comparação com países parecidos (Chile, Colômbia, Peru) quanto nações em estágio diferente de desenvolvimento. Esse patamar da poupança tem relação direta com o também baixo patamar de investimento. Consequentemente, o país tem dificuldade em atualizar o maquinário produtivo, implicando em menor crescimento. Além disso, como o governo fornece ampla rede de segurança social (programas de transferência de dinheiro, sistema universal gratuito de saúde, o SUS), o argumento microeconômico nos diz que o brasileiro tem menor incentivo para poupar, comparado a cidadãos de outros países com menor proteção social. Logo, esse fator joga para baixo a poupança doméstica, fazendo com que a taxa de juros real seja elevada para equilibrar o cenário macroeconômico.
Ainda nessa discussão, como o Estado brasileiro dispende grande parte do seu orçamento com gasto de custeio, principalmente o funcionalismo público, o espaço para realizar investimentos públicos é reduzido. É como se os gestores da economia considerassem mais importante o gasto com pessoal do que o investimento em infraestrutura. Este último tipo de investimento é discutido centrando na infraestrutura de transporte, a qual força a competitividade do setor agrícola para baixo. O transporte de grãos ocorre em rodovias mal preservadas, com diversos trechos sinuosos e carentes de reparos. A recomendação é a atualização do transporte por rede hidroviária e com portos mais eficientes. Novamente, porém, um dos problemas é a escassez de recurso público para auxiliar nessas melhoras. Concessões para o setor privado parecem ser o melhor caminho para se seguir, como de fato vem ocorrendo, com o exemplo mais atual sendo o novo marco regulatório para universalizar o saneamento básico.
O tópico 5 entra na controversa discussão sobre a desindustrialização. A conclusão é de que o rendimento real dos trabalhadores do setor industrial cresceu de forma mais rápida do que a produtividade industrial, culminando na perda de competitividade no comércio internacional. Nas comparações com outros países, o contraste se torna muito nítido. Problema adicional foi a apreciação cambial (aumento relativo do valor do real frente ao dólar) durante 2004-2011, contribuindo para afundar mais ainda a indústria. Também é mostrado o aumento do preço das manufaturas em comparação com o preço nacional. Em outras palavras, a indústria desfruta de posições monopolista/oligopolista no mercado nacional, conseguindo elevar o preço de seus produtos (proteção por meio de tarifas e subsídios contribuem para esse cenário). A perda de participação da indústria parece ser muito mais um problema de produtividade do que de um câmbio não suficientemente competitivo ou de uma taxa de juros mais baixa.
A última parte discute a política internacional do Brasil, com grande ênfase em um dos nossos principais parceiros comerciais, a China. Nossa economia é fechada, com elevada tributação sobre os importados e com poucos acordos de livre-comércio com os demais países. Não bastasse esses traços, no passado (durante a NME) o governo introverteu a economia para as cadeias produtivas nacionais, quando o mundo se movia para cadeias regionais e mundiais de valor. A recomendação, amplamente aceita atualmente, é a da necessidade de maior abertura econômica e integração internacional.
O livro é muito bem vindo ao fornecer discussão com rigor, utilizando dados e ferramentas estatísticas (econométricas) para sustentar as hipóteses. Para não economistas, a leitura poderá ser um pouco difícil e tediosa, dado o conteúdo técnico usado. De qualquer forma, o leitor poderá pular as partes matemáticas sem prejuízo do conteúdo. Sobre os tópicos discutidos, a ausência de uma discussão sobre o sistema tributário é significativa, segmento relevante para o entrave do nosso crescimento, e atualmente alvo de uma reforma em tramitação. Em resumo, para aqueles que gostam de discutir economia, o caminho é esse, e não as redes sociais.
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