Multiplicador do gasto é uma forma de avaliar a efetividade da política fiscal
Uma das principais ferramentas que governos possuem para acelerar o crescimento econômico é a política fiscal por meio do aumento do gasto publico. Expandindo o gasto público espera-se que esse impulso incentive o setor privado a aumentar a sua produção e a contratação de trabalhadores. Estes últimos, por sua vez, passarão da condição de desempregados para empregados, auferindo renda que será, parcialmente, convertida em maior consumo, o que dará novo impulso para a atividade produtiva.
Formalmente, essa relação entre o gasto público e o seu efeito sobre a produção é conhecida como multiplicador do gasto público. Economistas estimam a porcentagem da produção que será aumentada em virtude de um aumento de x% do gasto público. Esse número é importante pois fornece ideia do impacto da política fiscal sobre o crescimento.
Países desenvolvidos da Europa, os Estados Unidos e o Japão apresentam baixíssima taxa de juros, logo, realizar política fiscal expansiva (aumentar o gasto) se torna atraente, uma vez que o aumento do gasto público irá elevar em menor quantidade a taxa de juros. Em geral, quando eleva-se o gasto do governo, espera-se que a taxa de juros se eleve (pois a poupança total se reduziu). Essa taxa mais elevada encarece a tomada de créditos por consumidores e investidores, fazendo com que o investimento privado se reduza - processo conhecido como crowding out. Todavia, as economias citadas são caracterizadas por nível muito baixo dessa taxa de juros, portanto, rodadas de elevação do gasto público fariam com que os juros subissem pouco, com reduzido risco de desestimular o investimento privado, gerando, como esperado, maior produção total. Atualmente, os pacotes fiscais para lidar com a Covid-19 têm esse argumento.
Como em economia as coisas não costumam ser simples, há complicações nessa descrição. Temos fatores que enfraquecem o poder do multiplicador do gasto público. Um dos principais é o endividamento público. Economias com elevada dívida pública/PIB apresentam baixo multiplicador do gasto, pois os agentes desse país se preocupam com a sustentabilidade dessa dívida. Uma nação altamente endividada, elevando ainda mais os gastos, não parece seguir a cartilha de um bom devedor. Nesses casos, o risco país sobe, consubstanciando em maior taxa de juros. Como dito anteriormente, essa elevação da taxa de juros expulsa investimentos.
Outros dois empecilhos que enfraquecem o gasto público como promotor do crescimento são a efetividade do gasto e o comércio internacional. Por efetividade do gasto, observa-se como o governo realiza políticas públicas considerando alguns parâmetros: a) a renda destinada para política é desviada por grupos de interesse? b) o governo acerta o alvo? (se a política é para os pobres, são realmente os pobres que recebem os benefícios?) c) a política é bem elaborada? (serão construídos hospitais e escolas ou estádios de futebol?). Sobre o comércio internacional, consumidores tendem a comprar mercadorias de outros países (importações) quando se deparam com aumento de renda. Essas importações representam saída de recursos da economia, desse modo, enfraquecem a expansão da produção.
Considerando esses fatores, como podemos avaliar o multiplicador do gasto no caso brasileiro? Vamos por partes. Em primeiro lugar, o Brasil está em profunda recessão. Em tais circunstâncias, o gasto público tende a ter maior impacto, pois há espaço para expandir a produção nacional sem afugentar o investimento privado. Entretanto, os fatores que o enfraquecem abundam, com destaque para nossa situação fiscal, com dívida pública em trajetória explosiva. É muito provável que as taxas de juros (inclusive a Selic) subam nesse cenário, encarecendo o financiamento público e o investimento e consumo privado. O resultado pode ser a piora do endividamento público com irrisório ou nulo aumento da produção.
Uma das lições é que em tempos de afluência, governos deveriam poupar renda e reduzir a dívida pública, para que quando conjunturas adversas surgissem (elas sempre aparecem), essa poupança fosse convertida em política fiscal para reduzir a severidade da crise sem comprometer o equilíbrio fiscal - teríamos um multiplicador fiscal que não perderia potência por causa de uma situação fiscal crítica. Nosso país não seguiu essa recomendação, pelo contrário, gastamos muito nos anos de crescimento (2005-2013), e agora que tempos difíceis chegaram, não temos munição para gastar.
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