terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Resenha: Teoria dos Sentimentos Morais (Adam Smith)

Criador da mão invisível mostra tato e percepção afiada para entender comportamento individual



O pai fundador da Ciência Econômica, Adam Smith, é conhecido pelo seu livro mais famoso, A Riqueza das Nações, no qual mostrou, de forma muito clara e simples, que a busca pelo interesse individual produz harmonia entre produção e consumo e contribui para aumentar o bem estar da sociedade. Trabalhos futuros mostraram que há exceções nessa regra (4 para ser preciso, conhecidas como falhas de mercado - externalidades, assimetria de informação, poder de mercado e bens públicos), todavia, o princípio se sustentou com as críticas ao longo do tempo - consubstanciado e denominado de mão invisível.  

No livro Teoria dos Sentimentos Morais, publicado antes mesmo de A Riqueza das Nações, Smith procura indicar o porquê de nossas ações na esfera econômica. Em particular, o autor descreve os componentes que explicam nosso constante desejo de aumentar nossa remuneração, conforto e bem estar. 

"É sobretudo por considerarmos os sentimentos da humanidade que perseguimos a riqueza e evitamos a pobreza", diz Smith. Essa ideia permeia toda a obra. Estamos sempre em busca da aprovação da sociedade, ainda que ela não seja personificada fisicamente. Buscamos o aval de um ente abstrato. Não basta que sejamos bem vistos por amigos e familiares, desejamos ampliar o público, ainda que de forma inconsciente, ou às vezes de forma disfarçada - dado que uma pessoa que busca, de forma declarada, fama e glória, recebe críticas devido a sua ambição: "riqueza e honra são meros enfeites frívolos (...) Satisfazem mais efetivamente aquele amor à distinção, tão natural no homem". 

Outro ponto discutido é o egoísmo e a vaidade. Alguns leitores de A Riqueza das Nações costumam criticar Smith por ele defender condutas egoístas em meio ao princípio da mão invisível. Caso tivessem lido o livro Teoria dos Sentimentos Morais, teriam moderado as críticas. Smith não nega a existência do egoísmo, pelo contrário, o reconhece, e percebe como ele se conecta com a vida em sociedade: "Por mais egoísta que se suponha o homem, evidentemente há alguns princípios em sua natureza que o fazem interessar-se pela sorte de outros". Sobre a vaidade: "É a vaidade, não o bem-estar ou prazer que nos interessa".  Observe, portanto, que, segundo Smith, o drive que nos coloca a buscar melhoras em nossas vidas não decorre, primordialmente, pela nossa própria satisfação em termos de bem estar e conforto, mas pela forma que seremos visto pela sociedade, este ente abstrato. Novamente, assim como explicado no caso da riqueza, não são os bens que ela proporciona que almejamos, mas a aprovação de nossos pares decorrente dela - obviamente almejamos conforto e bens, entretanto, Smith coloca esses fatores como secundários.

Como autor liberal, Smith defende os dogmas dessa doutrina, como o Estado de direito para permitir a vida pacífica em sociedade, protegendo os indivíduos e limitando comportamentos prejudiciais: "As regras (...) são calculadas para propiciar a (...) grande finalidade: a ordem do mundo, a perfeição e a felicidade da natureza humana".

A dicotomia entre o Estado e indivíduo é resolvida pela seguinte sentença: "Sem dúvida, todo homem é por natureza primeiro e principalmente recomendado a seus próprios cuidados, e como é mais adequado para cuidar de si mesmo do que qualquer outra pessoa, é adequado e correto que faça assim". Esse trecho mostra que um dos grandes seguidores de Smith, o prêmio Nobel em Economia, Milton Friedman, utilizou vastamente desses escritos para formular o seu pensamento. Friedman mostraria como os programas que englobam o Estado de Bem Estar Social limitavam as possibilidades de conduta individual, além de carregarem o vício de tentarem resolver problemas pessoais, quando na verdade os próprios indivíduos são os mais indicados a buscarem soluções para si mesmos. 

As regras da sociedade deveriam lograr 3 objetivos: proteger a vida, a propriedade e os contratos: "As mais sagradas leis da justiça (...) são as leis que protegem a vida e pessoa do nosso próximo; a seguir vêm as que protegem sua propriedade e posses; por último, as que protegem o que se chama seus direitos pessoais, ou o que lhe é devido pelas promessas de outros". Citando novamente Friedman, este daria continuidade a esse raciocínio, o ampliando, como a recomendação de programas de transferência de dinheiro para indivíduos e subsídios públicos nas escolas para estudantes carentes. 

A leitura deste livro é recomendada para aqueles que desejam entender de forma mais precisa o pensamento de Smith. Também auxilia a eliminar mal entendidos, como o de que Smith é um proponente de uma sociedade egoísta. Sobre essa crítica, o autor se aproxima muito mais como um defensor da individualidade das pessoas - o que Hayek assinalaria como respeito ao desenvolvimento pessoal. Por fim, A Riqueza das Nações e a Teoria dos Sentimentos Morais evidenciam como os autores modernos utilizaram esses escritos para formularem suas proposições, evidenciado o fato de que a Ciência Econômica, assim como as demais ciências, evolui de forma gradual (step by step), recorrendo a antigos escritos e autores, e realizando acréscimos sobre trabalhos passados. 







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