Outros indicadores devem ser analisados ao traçar um panorama geral da economia
Muita
discussão tem ocorrido em virtude do baixo crescimento do produto interno bruto
(PIB) do Brasil em 2019. Há uma percepção generalizada de que esse indicador
encerra todo o quadro econômico, o que está incorreto – voltarei a isso daqui a
pouco. Igualmente inadequado e simplista é tomar esse índice como uma
aproximação da qualidade de vida do brasileiro.
Pela sua
definição, o PIB é o valor total da produção de bens e serviços finais em
determinado período – dado o contexto aqui, estamos considerando o ano de 2019.
A expansão da produção de 1,1% nesse período nos diz pouco ou quase nada sobre
o padrão de vida. Para analisar determinado padrão de vida, um indicador mais
aconselhável é o PIB per capita, aquele que divide o nível da produção total
pelo número de indivíduos. Por meio desse indicador, veremos que, embora a
China seja a segunda maior economia do mundo, ela se torna apenas a 75ª
economia mais rica (16 mil dólares por pessoa), enquanto os EUA, por sua vez,
ocupam a 12ª posição (56 mil dólares per capita) – por curiosidade, o Brasil é
o 84° mais rico do mundo, com 14 mil dólares por habitante (utilizei o PIB per
capita em paridade de poder de compra a preços reais). Como se vê, a conversa
de que a China ultrapassará os EUA é muito discutível dependendo do indicador
utilizado.
Caso o
interesse seja o de avaliar o quadro econômico, devemos considerar não somente
a taxa de crescimento do PIB, como também os preços domésticos, a taxa de
inflação. Por meio dessa taxa, temos uma visão a respeito do custo de vida, se
este está crescendo ou decrescendo, e em qual velocidade. É salutar considerar,
além da inflação, as contas externas, usando, por exemplo, a conta corrente do
balanço de pagamentos, e as contas fiscais, sendo o resultado nominal do
governo um bom indicador para essa tarefa. A conta corrente mostra a diferença
de bens e serviços exportados com os importados e o recebimento ou o pagamento
de renda proveniente do exterior (remessa de lucros é incluída nessa rubrica).
Uma conta corrente deficitária indica que o país é pouco competitivo em
comparação com as demais nações (estaria importando mais do que exportando).
Evidencia que dependemos do capital externo para financiar o nosso crescimento
(a contrapartida de um déficit na conta corrente é um superávit na conta
capital e/ou queda das reservas internacionais). Pior, pode mostrar um
endividamento crescente em moeda externa - a crise econômica da Argentina deriva, em parte, de sucessivos déficits na conta corrente. Desde 2010, ela tem apresentado apenas déficits, com destaque para os anos de 2017 e 2018, quando estes foram de, respectivamente, -4,9% e -5,3% em proporção com o PIB. A dificuldade de honrar pagamentos em moeda externa não se torna uma surpresa em vista desses dados (reportagem aqui).
No caso
das contas fiscais, o resultado nominal indica a diferença entre o total das
receitas e despesas do governo, incluindo municípios, estados e a União. Nessa
conta entra a despesa primária (gasto com educação, segurança e funcionalismo)
e o pagamento de juros da dívida pública. É uma imagem da austeridade ou
prodigalidade do Estado. No caso da economia brasileira, temos déficits
públicos recorrentes, significando um governo com pouco controle sobre suas
contas. Para ser preciso, atualmente temos déficit primário e déficit público –
a reforma da previdência, por exemplo, foi realizada para melhorar esse quadro.
Dessa
forma, para termos um quadro razoável de toda a economia brasileira, temos de
analisar a taxa de inflação, a conta corrente, o resultado nominal, e
acrescento as taxas de câmbio e de juros. A primeira mostra o preço da moeda
doméstica (real) em relação a alguma outra moeda (em geral o dólar). Quando a
taxa de câmbio está desvalorizada, com previsão de futuras desvalorizações, é
um sinal de alerta para o gerenciamento da economia, uma vez que os
investidores estariam retirando dinheiro do país, implicando em menor fundo
para o financiamento da atividade produtiva. Em relação à taxa de juros, esta
sinaliza, assim como o câmbio, a percepção do risco-país. A taxa de juros tende
a ser elevada em ambientes hostis ao investimento. Também é sensível em
cenários de incertezas, como o atual com o Coronavírus (Covid-19) (reportagem aqui ilustra essa relação).
Finda
essa breve explanação, agora pode-se incluir a taxa de crescimento do PIB, e
analisá-la juntamente com os demais indicadores. Cobrimos o ambiente externo
(conta corrente e taxa de câmbio), o governo (resultado nominal), os preços
(taxa de inflação), o custo de empréstimo/investimento (taxa de juros) e o
crescimento do país (taxa do PIB). De posse desses conceitos, melhores
diagnósticos podem, sem dúvida, serem elaborados sobre a economia.
Agora,
se o objetivo é averiguar a qualidade de vida, os indicadores elencados
anteriormente são insuficientes. Dever-se-ia observar a desigualdade de renda,
a taxa de criminalidade, o desmatamento ambiental, a fluidez do trânsito, entre
outros tantos índices. O índice de desenvolvimento humano (IDH), o qual avalia
a distribuição de renda, a saúde e a educação, é um indicar superior ao PIB per
capita no tocante a esse assunto. Logo, faz mais sentido dirigir um olhar mais
atento a ele quando o assunto é padrão de vida, mas como indicado, ele deixará
fatores importantes de fora. É também um índice incompleto para avaliar a
qualidade de vida. A lição é não simplificar demasiadamente questões
inerentemente complexas, como é o caso da economia, em apenas um indicador.
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