sábado, 21 de novembro de 2020

Resenha: Cultura de Crescimento: As Origens da Economia Moderna (Joel Mokyr)

Mokyr propõe nova explicação para a eclosão da Revolução Industrial

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A tarefa proposta por Joel Mokyr não é simples, ainda é amplamente debatida nos círculos acadêmicos. Quais fatores permitiram que a Revolução Industrial ocorresse na Europa, precisamente na Inglaterra, naquela data (século XVIII), e não em outra localidade, em diferente período de tempo? Essa é a pergunta que permeia toda a obra de Mokyr (A Culture of Growth: The Origins of the Modern Economy, no original). 

Logo no início o autor nos dirá a resposta a essa indagação: ascensão de uma cultura voltada para o conhecimento útil (useful knowledge). Esse conhecimento é aquele que conecta avanços científicos com aplicação prática na vida da população. É o conhecimento que permite a melhora na vida material, propiciando maior nível de conforto e novas utilidades (pense na luz elétrica, motor a vapor). 

O primeiro ponto a considerar é que para que esse tipo de valoração surgisse, tornou-se necessário alterações na forma como a sociedade enxergava e interpretava a ciência, em outras palavras, a cultura se alterou. Por cultura, o autor a define como um conjunto de crenças, valores e preferências que influencia o comportamento da sociedade. Esses traços são transmitidos socialmente pela interação entre familiares, amigos e pessoas próximas para subgrupos dessa mesma sociedade. 

Após essa definição, a questão ainda persiste. Por que essa cultura surgiu na Europa? A maior parte do livro se propõe a destrinchar esse ponto, usando outro conceito, o de empreendedor cultural (cultural entrepreneur) para auxiliar o raciocínio. O empreendedor cultural, de forma análoga com o empreendedor de nossa sociedade contemporânea, consegue criar novos processos de raciocínio, novas ideias, abrir avenidas para serem exploradas. Enquanto podemos citar, por exemplo, Bill Gates e a revolução que acarretou na informática com a entrada dos computadores com sistema operacional Windows, o empreendedor cultural consegue revolucionar antigas crenças, fazendo a população questionar suas veracidades (Charles Darwin, da teoria da seleção natural (evolucionista), é um grande exemplo desse tipo de empreendedor). O livro se concentra em dois desses empreendedores: Francis Bacon e Isaac Newton. 

Bacon (1561-1626) foi importante ao conseguir inserir a relação entre conhecimento útil e crescimento econômico. Argumentou que o conhecimento coletivo poderia ser usado para melhorar a vida das pessoas. Em um período no qual a crença generalizada era de uma sociedade estagnada, sem progresso, essa proposta não pode ser tido como pouco relevante. No caso de Newton (1643-1727), este mostrou que a natureza poderia ser compreendida por leis e regras, que existia uma mecânica por trás do mundo. Unindo as duas propostas, temos uma brecha para o surgimento de uma cultura voltada para o cultivo de conhecimento útil. 

Mokyr é cônscio de que outros fatores também concorreram para desencadear o "Grande Enriquecimento", termo designado para retratar o avanço material jamais visto pela humanidade após a Revolução Industrial. Esses fatores agregam o quadro institucional, com destaque para o sistema de freios sobre o poder executivo, maior tolerância com pensamentos heterodoxos, a fragmentação política das nações europeias, o que permitia a fuga de cientistas quando o governo central aprofundava restrições, e um mercado transnacional de ideias. Embora as fronteiras nacionais conseguissem, em alguns casos, enquadrar o deslocamento físico de pensadores, as ideias conseguiam circular livremente. Esse "mercado de ideias" foi importante ao permitir que o conhecimento fosse herdado e usado pelas gerações futuras. 

A China é citada como país avançado tecnologicamente. Esse avanço era similar ao europeu. Todavia, como sabemos, a Revolução Industrial não ocorreu no território chinês. Nesse caso, Mokyr faz exaustiva análise comparando várias características entre essas regiões. As restrições ao acesso de conhecimento impostas pelos governantes, a cultura de princípios confucionistas e a valorização de textos antigos foram fatores que frearam o avanço chinês.

Cultura de Crescimento: As Origens da Economia Moderna não exclui outras hipóteses explicativas para o "Grande Salto", mas acrescenta uma que, a julgar pela argumentação do autor, foi o fator primordial para explicar esse processo. No final do livro, Mokyr prevê (corretamente) que sua premissa será contestada, apoiada e discutida em trabalhos futuros. E que é assim que o conhecimento avança, pela contestabilidade, e no caso de não ser refutado, tende a sobreviver até que outra teoria, que consiga explicar melhor esse fenômeno, apareça e tome o seu lugar. A dinâmica que propiciou a Revolução Industrial também atuaria sobre a sua obra. 






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