sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Como se não houvesse amanhã


Nossos políticos são os principais responsáveis pelo crescimento do gasto público?

povo e políticos gostam de gastar dinheiro

Foto de History in HD
Não é novidade o fato de que o nosso país está atravessando forte crise fiscal. Também não é uma grande novidade afirmar que as reformas aprovadas (teto do gasto público e previdência) e as que provavelmente serão aprovadas em um futuro não muito distante (reformas administrativa e tributária) não resolverão o buraco fiscal no curto prazo. Por que chegamos nessa situação?
A resposta óbvia é que o Estado gastou mais do que arrecadou, ele não soube reproduzir o comportamento austero da fábula da formiga com a cigarra, quando no inverno a laboriosa formiguinha trabalhava, isto é, poupava, enquanto a pródiga cigarra apenas aproveitava a vida. Bem, a metáfora se adequa ao caso brasileiro.
O gráfico abaixo mostra o resultado fiscal do governo brasileiro em proporção com o PIB. O resultado fiscal engloba o gasto primário (gasto em educação, pessoal empregado, saúde e segurança) mais o gasto com o pagamento de juros. Observe que do ano de 2000, governo de Fernando Henrique Cardoso, até o último ano da série, 2016, governo da chapa Dilma/Temer, tivemos déficit em todos os anos. A primeira conclusão então é que embora a crise fiscal tenha emergido nos últimos anos, o comportamento perdulário do Estado a antecede em muitos anos. Mesmo nos anos 2003, 2004 e 2005, quando o governo de Lula implementou a redução do gasto público, o resultado se manteve, o governo sempre gastando mais do que arrecadando.



                         Fonte: OCDE

Das explicações mais comuns sobre o endividamento, uma delas é o pagamento de juros da dívida. Argumenta-se que o grande capital financeiro, ou elite financeira internacional, ou ainda os centros financeiros (e nesse caso o Brasil seria a periferia) se aproveitam ou exercem pressão sobre a taxa de juros brasileira para extraírem riqueza, se comportando como rentistas. Entretanto, se o gasto com juros é elevado, isso advém de uma grande dívida, a qual, por definição, é uma consequência do gasto. Dessa forma, esse raciocínio nos leva a uma tautologia: paga-se grande quantidade de juros porque o Estado gasta muito. O problema permanece sem solução.
Outra tentativa de resposta é a rigidez da despesa pública enquanto a receita é flexível, ou seja, em momentos de crise econômica, quando o crescimento se torna mais lento, a arrecadação tributária cairia, todavia, a despesa se manteria estável. O resultado seria déficits orçamentários. Essa explicação não está incorreta, sendo inclusive um dos fatores que culminaram nos crescentes déficits da previdência. Todavia, não explica, a despeito da rigidez da despesa, o porquê desta ser tão elevada e crescente ao longo dos anos.
Esse texto poderia se alongar em discutir argumentos sobre as contas públicas, e ainda assim não chegar a um lugar razoável. O ideal é buscar a essência do problema. Meu palpite é que o Estado é gastador porque este recebe intensa pressão da população para que assim o seja. Essa pressão é canalizada pelos políticos eleitos e legalizada por meio de leis. Todos endossam tal comportamento.
Faz parte da cultura brasileira a utilização do Estado para a solução de suas dificuldades, para quaisquer obstáculos, em quaisquer esferas da vida. O Estado é paternalista, mesmo que não consiga atender de forma eficiente essa função. Portanto, nós brasileiros somos responsáveis e cúmplices em relação ao estado das contas públicas.
A responsabilização do Estado pelas dificuldades que encaramos guarda estreita relação com a falta de responsabilidade individual com o nosso destino. O crescimento do Estado, isto é, a expansão do seu gasto, da sua rede de proteção, da sua legislação, de sua função como árbitro de conflitos, confirma o fato de delegarmos a nossa responsabilidade para essa entidade. Por outro lado, se responsabilizamos outra parte pelo nosso destino, nos tornamos meros coadjuvantes de nossa vida, não nos vemos como os principais agentes para a realização de nossos objetivos, e principalmente para nossas falhas. Caso esse comportamento não se altere, teremos o Estado se endividando gradativamente - como se não existisse o dia seguinte, o dia que cobrará o preço dessa dívida. Mas em matéria de economia o dia da cobrança sempre chega, pode demorar, mas não tarda. A atual crise fiscal não me deixa mentir.

Nenhum comentário:

Postar um comentário