sábado, 31 de outubro de 2020

Resenha: A Origem das Espécies (Charles Darwin)

Darwin cria a teoria da seleção natural, tese que revolucionaria a forma de entendermos o planeta e a Natureza

Charles Darwin


A Origem das Espécies é um clássico, livro que revolucionou a forma como o mundo passou a interpretar a evolução dos seres vivos, incluindo nós seres humanos. Embora tenha auxiliado no avanço do saber científico, fornecendo ferramentas para entendermos as diferentes espécies que existem e já existiram, ele também causou enorme confusão em outros campos, em especial quando a teoria da seleção natural foi usada no campo dos seres humanos. 

Em vários pontos da obra, Darwin realça o fato de que todos os seres vivos lutam para sobreviverem. A Natureza é o palco de incessantes movimentos, modificações, migrações e deslocamentos dos seres vivos. Os que conseguem sobreviver, aumentam o número de seus descendentes, aumentando a probabilidade de que sua espécie sobreviva, enquanto os que ficaram para trás sofrem a ameaça de extinção. A extinção de espécies ao longo das eras é a regra, e não a exceção

Como desdobramento temos a teoria da seleção natural. Ela nos diz que ao longo de vários anos pequenas modificações ocorrem nos seres, alterações às vezes imperceptíveis, mas que podem ser o fator fundamental para permitir que essa espécie consiga sobreviver. O trecho a seguir explica o conceito nas palavras do autor: 

"Devido a essa luta pela vida, quando qualquer variação, mesmo que pequena e independentemente da razão que a originou, oferece qualquer grau de vantagem para um indivíduo de qualquer espécie nas suas relações infinitamente complexas com os outros seres orgânicos e com a natureza externa, esta tende à preservação do indivíduo e geralmente será herdada por seus descendentes. Dessa forma, a prole também terá mais chance de sobreviver, pois, dos muitos indivíduos de qualquer espécie que nascem periodicamente, apenas um pequeno número consegue sobreviver. A esse princípio, por meio do qual cada pequena variação, quando útil, é preservada, eu chamo seleção natural". 

Essa teoria chocou-se frontalmente com a tese criacionista, na qual cada ser é formado de forma perfeita. Enquanto essa última não prevê modificações ao longo das eras, a seleção natural é toda construída em alterações do seres. O mais apto consegue sobreviver, não o mais superior. Os que conseguem desenvolver traços físicos, instintos e habilidades que elevem a chance de sobreviver, tenderão a permanecer vivos. Mesmo dentro da mesma família de espécies, os descendentes podem representar a extinção de seus progenitores, caso os primeiros desenvolvam aptidões que melhorem suas permanências. 

Darwin cita os trabalhos de Malthus e de Adam Smith durante o livro para apoiar algumas de suas teses. Eu já tinha ouvido essa informação como boato, todavia, lendo o livro, percebi que é um fato. No caso de Malthus, Darwin nos diz que as espécies tentam se reproduzir na maior quantidade possível, para elevar sua chance de sobrevivência. Afirma ainda que esses seres se deparam com uma restrição que a todos atinge: os alimentos. Malthus usou esse raciocínio para os humanos, dizendo que quando aumentávamos o número da população além da quantidade que os alimentos conseguiam suprir, tínhamos episódios de fome e mortes, até que a proporção retornasse para o seu equilíbrio. Darwin leva essa teoria para a Natureza, aplicando-a para mostrar os limites que os seres enfrentam. 

No caso de Adam Smith, o autor de A Origem das Espécies usa a divisão do trabalho para mostrar como essa nova forma de produzir elevou a probabilidade de sobrevivência dos humanos, permitindo que nossa população se elevasse a taxas jamais vistas na história da humanidade. De forma análoga, seres vivos que consigam desenvolver características que melhorem sua sobrevivência, poderão resistir à luta incessante pela sobrevivência. 

Em alguns momentos do livro, Darwin escorrega na descrição de sua teoria e classifica seres em "superiores" e "inferiores". Imagino que os autores que pegaram a teoria da seleção natural, e a utilizaram no caso das raças humanas (Darwinismo social), tenham interpretado essa brecha como indício de que faria sentido usá-la entre nós. Sabemos das consequências disso.

Ramo mais promissor é o da economia. Alguns autores sugerem que poderíamos compreender o funcionamento das economias de mercado utilizando a seleção natural. Nesse caso, empresas conseguem sobreviver ao se adaptarem às vicissitudes e desenvolvimentos do mercado. As que conseguirem entregar melhores serviços, conseguiriam sobreviver, enquanto as demais seriam fechadas. As videolocadoras da década de 1990 se tornaram obsoletas com os avanços da tecnologia e das exigências dos consumidores. Netflix, Amazon Prime video e Disney plus se adaptaram a esse novo cenário, fornecendo filmes e séries online, a um custo baixíssimo se comparado ao das videolocadoras. Futuramente, caso essas 3 empresas não consigam acompanhar a evolução do mercado, podem se tornar obsoletas, com o risco de serem fechadas (extintas), enquanto outras assumirão a dianteira. Faz sentido associar a seleção natural com esse tipo de processo?

A Origem das Espécies merece ser lido por muitos motivos. Desses motivos, considero fundamental o que mostra que nós humanos não somos o centro do universo. Somos apenas mais um ser vivo. O prefácio é pontual nesse sentido: "Se Galileu foi o primeiro a ver com os próprios olhos os confins do sistema solar e imaginar a imensidão do Universo, Darwin talvez tenha sido o primeiro a enxergar na longínqua origem da biodiversidade a razão do fenômeno humano (...) Galileu nos demoveu da certeza da grandiosidade astronômica de nosso planeta, e Darwin nos convenceu da pequeneza biológica dos humanos" (Nelio Bizzo).















 

Nenhum comentário:

Postar um comentário