Declarações de permissividade com o gasto e omissões de reformas ajudam a explicar piora da moeda
A expressiva desvalorização da taxa de câmbio brasileira chamou a atenção no início da pandemia (gráfico abaixo). Ela não foi muito criticada naquele período porque o mundo todo passava por algo parecido. E também ao reconhecimento de que o governo brasileiro não tinha responsabilidade pela chegada da Covid-19.
Entretanto, agora as críticas aumentaram, dado que a nossa moeda, o real, está entre as piores desse ano, com enorme desvalorização anual acumulada.
Na primeira metade desse ano, essa desvalorização se deu por conta de dois fatores: aumento do risco-país (investidores pioraram a percepção do Brasil em honrar suas dívidas) e valorização do dólar. Como não realizamos as reformas que poderiam melhorar nossa imagem, como a reforma administrativa, tributária e dos gatilhos, o mercado interpretou (corretamente) essa omissão como piora no ambiente fiscal. Sobre o dólar, em momentos de crise internacional investidores se apegam a ativos líquidos e pouco arriscados, sendo o dólar, por excelência, dotado dessas características. Pela lei da oferta e da demanda, o aumento da demanda pelo ativo faz com que o seu preço se eleve.
Um adicional para piorar a imagem fiscal brasileira é a insistência do governo federal em criar, ou melhor dizendo, expandir o programa de transferência de renda atual (Bolsa Família), denominado agora como Renda Cidadã. A princípio, nada de errado em realizar políticas públicas, principalmente quando o público alvo são os mais vulneráveis. A complicação decorre de fazer política sem possuir recursos.
Na dificuldade de encontrar esses recursos, afirmações despropositadas, como a defesa pelo fim do Teto do Gasto, são ditas como se tudo resolvessem. Mas a experiência mostra que os recursos são escassos - princípio fundamental da economia. Pode-se ignorá-lo, entretanto, não há como fugir de suas consequências.
O ideal seria o rearranjo dos atuais gastos, de forma a alocar parte deles para o novo programa, sem alterar o atual nível de gasto público. Outra solução seria a realização das reformas elencadas anteriormente. Essa segunda opção demandaria tempo para surtir efeitos. Tenho a impressão, a qual espero estar equivocado, de que o governo relacionou o aumento de sua popularidade e aprovação com os auxílios emergenciais de R$ 600, e que pretende institucionalizar programa parecido como forma de alavancar essa popularidade. Isso explicaria a pressa em realizar o Renda Cidadã, ainda que em momento inadequado, dado as restrições fiscais.
Esse dilema, a ausência de reformas fiscais e a piora do nosso endividamento não passaram despercebidos pelo mercado financeiro. A profunda desvalorização da taxa de câmbio mostra que esse desajuste foi precificado, com a queda de valor da moeda brasileira. Aos consumidores de importados, essa notícia não é muito boa, pois parece que o patamar real/dólar tenderá a permanecer elevado por longo tempo.
PARA APROFUNDAR:
Tenho um texto que mostro duas consequências de ignorar as restrições fiscais aqui
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