segunda-feira, 11 de maio de 2020

Em ranking de resiliência econômica, Botswana é o 1° colocado, Brasil é o 30° e Venezuela segura a lanterna

Ranking de países emergentes reflete anos de boa conduta econômica

economia emergente


A revista The Economist listou os países emergentes mais bem preparados economicamente para enfrentar a Covid-19 (figura abaixo) - o quão adequadas as condições macroeconômicas dessas economias estão frente aos efeitos recessivos da pandemia.

economias emergentes

Da lista de 66 países, o primeiro colocado é o país africano Botswana. O Brasil ficou em 30° lugar, enquanto a lanterna ficou com a Venezuela. A república de Botswana se tornou independente  da Grã-Bretanha na década de 1960, tendo implantado um sistema político democrático com diferentes partidos. O país ganhou projeção internacional quando multiplicou sua riqueza em 100 vezes nos últimos 50 anos

Vamos dar uma olhada nos indicadores chaves da Botswana para entender essa história - ao mesmo tempo contrastando-os com os dados relativos ao Brasil. O primeiro gráfico mostra o nível da dívida do governo central em proporção com o PIB. O nível de endividamento de Botswana é muito inferior ao do Brasil, enquanto a economia brasileira apresenta dívida acima de 70%, a de Botswana não atinge 20% do PIB. Se o Banco Mundial já tivesse disponibilizado os dados mais atuais, veríamos que o endividamento do Brasil cresceu muito nos últimos anos.

banco mundial

O próximo gráfico retrata as contas externas dos países, o resultado da conta corrente do balanço de pagamentos. A conta corrente engloba o resultado das exportações e importações de bens e serviços (balança comercial), a entrada ou saída de renda proveniente dos fatores de produção (conta de rendas) e as remessas de recursos para o exterior (transferências unilaterais). Quando o país apresenta déficit na conta corrente, isso significa que ele está consumindo mais do que os seus recursos domésticos possibilitariam. Nesse caso, ele precisa se endividar externamente para compensar o déficit corrente. 

banco mundial


Botswana tem desempenho melhor do que o Brasil nessa conta, tendo apresentado superávits correntes de mais de 10% em alguns anos. Logo, Botswana não precisa se endividar externamente para fechar suas contas, ao passo que o Brasil precisa da entrada de capital externo para manter o seu balanço de pagamentos equilibrado. De 2008 a 2018, o Brasil apresentou somente déficits correntes, ou seja, 11 anos seguidos precisando de entrada de capital externo para financiar o crescimento do consumo interno. Sinal de desajuste econômico.

Como resultado do comportamento das contas fiscais e externas, temos a taxa de juros sobre o financiamento da dívida, aquela taxa na qual o mercado financeiro está disposto a incorrer ao risco de sofrer default ao colocar o seu capital em determinado país. Em geral, quanto mais instável o ambiente macroeconômico, maior a taxa de juros exigida. Veja que em todos os anos o Brasil apresentou maior taxa de juros para rolar a sua dívida. É uma relação trivial: quanto maior a dívida, maior a taxa de juros do seu financiamento - com algumas exceções, como o Japão.

taxa de juros da dívida


É um ciclo virtuoso quando o país consegue poupar mais do que gastar, pois dessa forma ele tende a reduzir o seu estoque de dívida pública e a pagar menor quantidade de juros. Esse é o caso da Botswana. Um reflexo disso é a elevada poupança doméstica (poupança do governo mais poupança privada), a qual consta em 30% em relação ao PIB, ao passo que o Brasil tem uma poupança doméstica próxima de 18%. 

banco mundial

É uma relação conhecida por economistas de que a soma da poupança doméstica com a poupança externa corresponde ao investimento total da economia. A Botswana não precisa se endividar externamente para financiar o seu investimento, uma vez que sua poupança doméstica é elevada. Ao mesmo tempo, ela possui superávits correntes, ou seja, ela exporta capitais para outras nações. 

Para terminar, o último gráfico é oportuno para esclarecer uma confusão que normalmente ocorre no debate macroeconômico do Brasil. Afirma-se que o Brasil possui elevado nível de reservas internacionais, e que por isso poder-se-ia gastá-las para financiar o investimento ou abater o patamar da dívida pública. Observe no gráfico que a proporção das reservas internacionais com os compromissos de dívida externa é consideravelmente inferior ao nível de Botswana. Isso decorre porque temos um nível de dívida externa mais próximo do total das reservas em relação ao de Botswana, em outras palavras, temos menor espaço para elevar o endividamento externo. Ao mesmo tempo, significativa parte de nossas reservas internacionais estão comprometidas para pagamento futuro da dívida externa. Parte da explicação desse fato é o de que a formação dessas reservas decorreu da emissão de dívida externa. Em resumo: é perigoso pensarmos em gastar as reservas internacionais sem considerar os passivos externos.

banco mundial


Finalizando o texto, a Botswana conseguiu formar elevada poupança interna, fazendo com que o endividamento externo não fosse necessário para financiar o crescimento do país. Isso gerou uma dívida pública reduzida, juntamente com menor fardo de juros para pagar. Consequentemente, o país tem maior margem de manobra na atual crise, podendo inclusive se endividar internamente ou externamente, pois tem espaço para isso, sem comprometer o ambiente macroeconômico. O Brasil, por sua vez, está em delicado equilíbrio, correndo o risco de sofrer crescente desvalorização da moeda, fuga de capitais e dívida pública explosiva (escrevi sobre isso aqui). Quem faz a lição de casa corre menos perigos no futuro.

Fonte: Banco mundial, FMI e The Economist












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