quarta-feira, 6 de maio de 2020

Resenha: Narrativa Econômica (Robert Shiller)

Shiller propõe a incorporação de narrativas em estudos quantitativos para aprimorar previsões econômicas

premio nobel



Robert Shiller recebeu o prêmio Nobel de economia em 2013 por suas contribuições sobre o entendimento do preço de ativos, ao utilizar não somente métodos quantitativos, como também considerar fatores subjetivos - aspectos da economia comportamental. O seu mais recente livro, Narrative economics (Narrativa econômica), segue esse padrão. Este consegue mostrar como diferentes contextos/alterações/transformações de cunho econômico podem ser compreendidos por meio do conceito de narrativas.

Segundo Shiller, narrativa econômica "is a contagious story that has the potential to change how people make economic decisions, such as the decision to hire a worker or to wait for better times, to stick one’s neck out or to be cautious in business, to launch a business venture, or to invest in a volatile speculative asset". Assim, narrativa econômica pode ser uma estória (real ou fictícia) que consegue influenciar o comportamento dos indivíduos. Ao alterar a forma como agimos, essa narrativa exerce efeito sobre o ambiente econômico.

A narrativa pode ser transmitida por meio de conversas informais, por redes sociais, jornais, filmes ou livros. Uma importante característica da narrativa é o seu comportamento semelhante ao de doenças contagiosas (epidemiologia de doenças). Como estamos vivendo tempos anormais, com a Covid-19, não é tão estranho esses termos (o livro foi publicado em 2019, portanto Shiller nem sonhava com a ideia da Covid-19). Veja a figura abaixo, a qual retrata o comportamento do vírus Ebola na Libéria. Assim como o Covid-19 se comporta, o Ebola também apresentou trajetória parecida, isto é, há o período de sua difusão, atinge-se o pico, e posteriormente perde-se força com o tempo (para economistas este padrão é muito famoso, uma típica distribuição normal). 
Ebola

No livro, Shiller mostra que o comportamento de narrativas também segue padrão semelhante ao da difusão de doenças. Agora observe o gráfico abaixo, o qual retrata o percentual em que os termos "automação" e inteligência artificial" aparecem em jornais e revistas. Repare que o padrão é cíclico. Narrativas podem voltar a aparecer após períodos de esquecimento

automação


Nesse caso em particular, o economista assinala que, geralmente em períodos de recessão, narrativas realçando o temor de máquinas substituindo a mão-de-obra humana ganham fôlego. As pessoas, atemorizadas, passam a consumir menos e a poupar mais, uma vez que o futuro parece nada promissor. Esse comportamento parcimonioso agrava a recessão, pois a demanda sofre adicional redução impulsionada pelas narrativas. Dessa forma, narrativas podem criar profecias auto-realizáveis. 

No decorrer do livro, Robert Shiller detalhará diversas narrativas, mostrando como elas afetaram o comportamento da população, que por sua vez repercutiu sobre a economia. A crítica do autor é construída sob esse arcabouço. Pesquisadores, ao desconsiderarem o efeito das narrativas sobre as previsões econômicas, comprometem suas previsões.

Por outro lado, Shiller reconhece que uma das principais dificuldades de relacionar narrativas com a economia é o desafio de distinguir causalidade de correlação. A narrativa causa a crise ou a existência da crise contribui para o surgimento da narrativa? Ou temos um pouco dos dois efeitos?

Em resumo, o livro provavelmente irá acelerar um processo que já vem ocorrendo na economia, o de atrelar aspectos da economia comportamental nas análises da conjuntura econômica. Shiller moderniza o conceito de expectativas ao adicionar o termo narrativa. Narrativas produzem expectativas. Expectativas afetam o mundo econômico. O Big Data está em amplo crescimento, o que pode contribuir para quantificar as narrativas, uma vez que pode-se traçar gráficos com citações das narrativas. Previsões econômicas poderão ser aprimoradas ao considerarem esses aspectos. Lógico, demandará tempo, mas o caminho parece ser esse.

Fonte dos gráficos: livro Narrative economics (Robert Shiller)












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