sábado, 22 de agosto de 2020

Resenha: Reflexões e comentários 1970-1978 (Eugênio Gudin)

Gudin explica a necessidade de aumentar a produtividade da economia para elevar o padrão de vida do brasileiro

livro economista sumoc


Eugênio Gudin foi o responsável pela implantação do curso de Ciências Econômicas no Brasil, ajudando, além disso, a promover o conhecimento sobre economia com seus inúmeros artigos e livros publicados. Trabalhou no setor privado - principalmente nos segmentos ferroviário e de construção - e foi Ministro da Fazenda na década de 1950, sendo importante consultor, mesmo que informalmente, para a condução econômica do país - Roberto Campos revela esse ponto na sua obra prima A Lanterna na Popa (resenha futura). 

Seguindo o livro anterior, Para um Brasil Melhor, Gudin apresenta uma coleção de artigos publicados entre os anos 1970 e 1978, englobando o período do regime militar e os choques do petróleo, os quais desorganizaram a economia brasileira, exigindo forte ajuste recessivo. Outros temas são debatidos, como política internacional, integração econômica e infraestrutura dos transportes - e tópicos não estritamente econômicos, como cultura e ambiente social. Gudin é dotado de elevada cultura e erudição, como pode ser percebido ao longo dos seus textos.

Em Reflexões e comentários, o autor afirma que o principal elemento para o subdesenvolvimento econômico brasileiro é o capital humano, a mão de obra pouco capacitada para realizar tarefas complexas e manejar máquinas sofisticadas. A produtividade do trabalho do país é baixa, sendo elevada nas economias mais dinâmicas. Assim como no seu livro anterior, Gudin bate muito nessa tecla, resumindo a problemática do crescimento no termo produtividade. A recente resenha que fiz da coletânea de artigos de pesquisadores da FGV, A Crise de Crescimento do Brasil, também conclui que nosso principal obstáculo para gerar maior crescimento é justamente a produtividade. Isso mostra o acerto e precisão de Gudin, pregando a necessidade de aumentar nossa produtividade pelo menos desde a década de 1960. 

Para lograr êxito nessa tarefa, a sua proposta principal é permitir a formação de uma economia mais dinâmica e vibrante, o que poderia ser obtido por meio da redução do protecionismo, do incentivo à entrada de capital externo e pela recondução do papel do Estado para serviços essenciais (notadamente educação e saúde), evitando o seu crescimento no setor produtivo. Sobre o capital externo, quando Ministro da Fazenda, Gudin foi o responsável pela Instrução 113 da Sumoc, a qual incentivou a importação de maquinário e equipamento externo - sendo pilar importante no governo de Kubitschek na realização dos amplos investimentos do Plano de Metas. Quanto ao redirecionamento do governo, Gudin mostra preocupação com o fato de que "das 500 maiores empresas brasileiras nada menos de 8 estatais figuram entre as 10 primeiras". Evidência do agigantamento do setor estatal promovido pelos militares. 

Gudin se preocupava também com o elevado crescimento populacional. Dizia que a expansão e acumulação de capital não conseguiam acompanhar o avanço dos habitantes, fazendo com que o capital por pessoa se reduzisse, implicando na queda de padrão de vida dos brasileiros. Acontece que na sua época muitos defendiam o aumento da população, pois argumentava-se que mais braços produziriam mais. Eugênio Gudin contra-argumentava apontando que pouco vale muitos braços se estes não são produtivos. Além disso, maior população implica em maior necessidade de infraestrutura urbana para atender necessidades básicas dos habitantes, ou seja, maior gasto público em meio a uma conjuntura de restrição de recursos fiscais. Consequentemente, defendia o planejamento familiar, isto é, políticas públicas para conscientizar famílias pobres sobre a limitação de filhos. 

No campo da política, afirmava que nossa população não tinha educação política necessária para escolher os seus representantes. Em um país dilacerado pela fome e pobreza, com grande número de analfabetos, dizia que seríamos alvo fácil para demagogos e políticos carismáticos. Acreditaríamos em promessas fáceis e simples para problemas complexos, portanto, propostas infactíveis. Jânio Quadros, João Goulart e Juscelino Kubitschek eram citados como exemplos para reforçar sua tese - o último deles é fortemente criticado pelo gasto para a construção de Brasília, quando era imperioso o gasto em educação e saúde dos brasileiros.

Gudin enxergou o que poucos conseguiram perceber na época: a necessidade de permitir a entrada de empresas multinacionais para complementar a matriz produtiva e promover maior competição doméstica. Visualizou a baixa produtividade das estatais, o esbanjamento de recursos fiscais em projetos pouco viáveis e a complacência com déficits públicos - os quais poderiam alimentar um processo hiperinflacionário, como de fato ocorreu no final dos anos de 1980. Previsões acertadas. Estaríamos em melhor caminho caso tivéssemos dado maior ouvido aos ensinamentos de Gudin. 













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